21 de fevereiro
Padre Noël Pinot
Mártir de Vandéia
Noël Pinot (Angers, 19 de dezembro de 1747 – Angers, 21 de fevereiro de 1794) foi um presbítero francês, venerado como beato pela Igreja.
Capelão do hospital dos incuráveis de Angers (Vandeia, França) e, depois, pároco de Le Louroux-Béconnais, depois de se instalar a Revolução na França, recusou-se a prestar juramento para a observância da constituição civil do clero, e foi destituído.
Processados várias vezes, foi condenado à guilhotina por "fanatismo religioso": foi levado ao patíbulo revestido dos paramentos litúrgicos por escârnio e decapitado.
Foi proclamado beato, por ter sido mártir, por Papa Pio XI, aos 31 de outubro de 1926.
O seu elógio pode ser lido no Martirologio Romano no dia 21 de fevereiro. É um dos Mártires de Angers, ou da Vandéia.
A seguir uma biografia mais detalhada:
Beato Noël Pinot: “Introibo ad altare Dei”
Revestido com seus paramentos sacerdotais por decisão dos carrascos, o padre Pinot pronunciou antes de subir ao cadafalso aquelas palavras que tantas vezes repetira diante dos degraus do altar.
Irmã Clara Isabel Morazzani Arráiz, EP
Corria o ano de 1791. Num frio domingo de janeiro, os habitantes de Le Louroux-Béconnais, localidade próxima de Angers, comprimiam-se na igreja. Um sentimento de ansiedade os dominava, pois o prefeito Jean Boré os convocara para assistir, terminada a Missa, ao juramento que o pároco Noël Pinot estava intimado a prestar ante a junta municipal ali reunida.
No dia 12 de julho do ano anterior, a Assembleia Constituinte aprovara a Constituição Civil do Clero, com a qual visava reestruturar as circunscrições eclesiásticas da França e converter os Bispos e sacerdotes em cidadãos-funcionários. Para garantir sua aplicação, todos os clérigos deviam jurar fidelidade a ela, sob risco de sofrer uma severa repressão da parte das autoridades revolucionárias.
Entre a população do Anjou,1 marcadamente religiosa e muito influenciada pelo recente apostolado de São Luís de Montfort, o descontentamento e a inconformidade com tão injusta imposição eram patentes. "Cada um, padres e fiéis, tinha os olhos fixos no padre Pinot, para saber como e em que medida ele resistiria às ordens do governo. Tal era seu renome de virtude e santidade que seu exemplo, em qualquer sentido, teria grande repercussão e arrastaria numerosos imitadores".2
Mas naquela manhã de inverno, o pároco de Louroux não parecia ter pressa em pronunciar seu juramento. Demorou-se tanto na sacristia, retirando os paramentos e rezando suas orações após a Comunhão, que o prefeito foi buscá-lo, exigindo-lhe imediata submissão às suas ordens, sob pena de ser demitido de suas funções. Por única resposta, obteve uma recusa tão firme quanto calma, baseada num irretorquível argumento: nem a lei nem o prefeito poderiam retirar-lhe os poderes que de Deus recebera.
Pároco entregue à sua missão
Grande foi a alegria do povo perante essa atitude. Na verdade, ninguém duvidara da integridade do padre Pinot, a quem todos conheciam de sobra e ao qual devotavam profunda afeição. Desde sua chegada àquela paróquia, a maior de toda
a diocese, ele se entregara à sua missão com o mesmo ardor com o qual cuidara, durante sete anos, da capelania do Hospital dos Incuráveis, em Angers.
Infatigável, percorria as distâncias que o separavam das aldeias mais afastadas desdobrando-se em atenções e não poupando esforços. Segundo o testemunho de seus contemporâneos, a virtude na qual mais se distinguia era, sem dúvida, a caridade. "Ele se dava todo a todos, e oferecia aos fiéis e ao clero dos arredores o modelo acabado da perfeição sacerdotal".3
Como pároco exemplar, preocupava-se sobremaneira em distribuir os Sacramentos, converter os pecadores, resgatar os extraviados e dar a todos uma sólida formação cristã. No púlpito revelava-se um teólogo seguro; no confessionário, um inigualável diretor de consciências; na catequese, um mestre ameno e atraente.
Virtudes aparentemente opostas
Após o tormentoso episódio ocorrido com o prefeito, o padre Pinot decidiu quebrar o silêncio e afirmar de público sua posição. Alguns domingos depois, ante os oficiais municipais e o próprio prefeito, acompanhados por numerosa assembleia, pronunciou um longo discurso, expondo as razões pelas quais rejeitava aquele decreto.
Sua voz clara, resoluta e eloquente ressoou no recinto sagrado, afirmando ser seu dever rejeitar a Constituição Civil do Clero, contrária aos princípios da Igreja e cujo juramento o tornaria indigno de seu ministério. Bem conhecia ele as tribulações que o aguardavam, mas o receio de perder o cargo, a liberdade ou mesmo a própria vida, jamais o faria capitular.
Todos os presentes, acostumados à habitual bondade e doçura de seu pároco, viam agora reluzir nele grande firmeza e intransigência. Maravilhoso equilíbrio, do qual só as almas santas são capazes, sabendo harmonizar virtudes aparentemente opostas, que, no entanto, se complementam de modo admirável.
De mãos amarradas, como um malfeitor
Poucos dias depois, cem homens da Guarda Nacional atravessaram durante a noite e em silêncio a pequena cidade, e cercaram a casa paroquial, trazendo um mandato de arresto para o cidadão Pinot. Ele mesmo, interrompendo as preces que costumava prolongar madrugada adentro, veio abrir a porta. Recebeu-os com cortesia, deixou-se algemar sem resistência e foi conduzido a Angers.
Impossível não estabelecer um paralelo entre esse incidente e o sucedido no Horto das Oliveiras, quando o Redentor do mundo entregou-Se livremente nas mãos dos ímpios. O tardio da hora, o número exorbitante de soldados - explicável apenas pelo medo de uma reação popular - e sua insolência recordam as narrativas evangélicas (cf. Lc 22, 47-54). Mais ainda, a determinação nobre e serena da vítima diante dos perseguidores é imitação fiel da sublime atitude do Prisioneiro do Getsêmani.
Obrigado a desfilar pelas ruas de Angers de mãos amarradas como um malfeitor, o padre Pinot foi encarcerado na prisão. Poucos dias depois, recebeu a sentença pelos seus "crimes": deveria permanecer por dois anos a oito léguas
de distância de sua paróquia.
"Convertedor irresistível e incorrigível"
Decidiu, então, exercer o ministério em outras cidades do Anjou. Angers, Corzé, Beaupréau e toda a região de Mauges se beneficiaram durante longos meses de seu apostolado, cujos frutos não demoraram a exasperar seus adversários. À sua passagem, a vida cristã se incrementava, o fervor crescia e - o que lhes parecia pior - muitos sacerdotes juramentados retratavam-se e voltavam à comunhão com a Igreja.
Como crescia cada vez mais a fama desse "convertedor irresistível e incorrigível, que por toda parte ressuscitava Jesus Cristo nas almas",4 as autoridades resolveram dar-lhe caça e lançá-lo num calabouço, na esperança de fazê-lo calar-se definitivamente. Mas, por especial proteção de Deus, ele sempre conseguia escapar, viajando de aldeia em aldeia e passando de casa em casa sem cessar sua atividade missionária.
Uma preocupação, porém, ensombrecia-lhe o espírito: os habitantes de Louroux estavam privados da assistência sacramental havia mais de dois anos...
Ainda não havia chegado sua hora
Em meados de 1793, um acontecimento inesperado veio facilitar a atuação do padre Pinot. As vitórias do exército da Vendeia em Thouars, Saumur e Angers deixaram desimpedido o caminho de Louroux para o nosso fiel sacerdote. Sua chegada à antiga paróquia foi um autêntico triunfo: aquela gente simples, mas de fé robusta, recebeu-o ávida de seus ensinamentos, saudosa de suas cerimônias religiosas.
Não obstante, pouco durou aquela paz: a derrota do exército vandeano diante de Nantes, em 29 de junho, redundou num recrudescimento do Terror. O virtuoso sacerdote via-se novamente em perigo de vida; todavia, decidido a não deixar seu rebanho, optou por permanecer clandestinamente no território paroquial.
Durante o dia ocultava-se em granjas e moinhos isolados, dividindo as horas entre a oração, a leitura e o sono. E quando as primeiras sombras da noite envolviam os bosques e os campos, saía da reclusão e exercia seu ministério: ouvia Confissões, assistia doentes, batizava crianças, realizava casamentos. À meia-noite celebrava a Eucaristia num estábulo, num celeiro ou mesmo ao relento, para uma assistência sempre numerosa.
Suas movimentações noturnas, embora discretas, despertaram a suspeita dos esbirros da municipalidade. Muitas vezes esteve na iminência de ser apanhado, e em certa ocasião, precisou esconder-se num amontoado de roupas; em outra, deitou-se sob o feno de uma manjedoura; pouco depois, escapou do refúgio no qual se encontrava minutos antes da irrupção de um contingente da Guarda Nacional...
A Divina Providência velava sobre aquele filho dileto, pois ainda não era chegada sua hora; mas ele, convicto de que cedo ou tarde acabaria por cair nas mãos dos perseguidores, alegrava-se na expectativa do martírio.
Traído e humilhado como Cristo
Na noite de 9 de fevereiro de 1794, quando se preparava para celebrar a Missa numa casa da aldeia de La Milanderie, ouviram-se fortes golpes na porta. Escondeu-se numa arca de madeira, com todos os ornamentos litúrgicos e o próprio cálice, enquanto a dona da casa foi abrir. Cinquenta homens invadiram a humilde moradia, proferindo ameaças e revistando tudo minuciosamente. Encontraram-no, afinal, e fizeram-no sair, em meio a insultos e zombarias.
O Divino Mestre - a quem o padre Pinot tanto procurara imitar - reservava para seu fiel ministro atrozes sofrimentos, desejando configurá-lo mais a Si. Com efeito, na origem desta detenção estava um delator outrora socorrido pelas esmolas do bom pároco: tendo divisado seu benfeitor no quintal da casa, apressara-se em denunciá-lo às autoridades, atraído, como
Judas, pela remuneração prometida.
O padre Pinot foi conduzido de imediato a Louroux, onde teve lugar uma ignominiosa cena, reflexo da Paixão de Cristo: juízes e guardas cuspiram-lhe no rosto, esbofetearam-no e feriram-no a pauladas. Um deles, que também havia sido objeto dos favores do caridoso pároco, ouviu da inocente vítima estas palavras, qual paternal convite e terrível censura: "Infeliz; entretanto, não te fiz senão o bem!".5
Após breve interrogatório, o prisioneiro foi transferido para Angers, onde, à espera do julgamento, permaneceu dez dias
num escuro e inóspito cárcere, alimentado apenas a pão e água.
Perante o tribunal, respondeu às perguntas com segurança e serenidade. Afirmou não ter jurado a Constituição porque sua consciência o impedia, e não se haver exilado, segundo a exigência das leis, porque devia cuidar da paróquia a ele confiada por Jesus Cristo, por meio de sua Igreja.
Em sua fronte resplandecia a alegria dos eleitos
Em consequência, o cidadão Noël Pinot foi condenado à guilhotina. Ouviu a sentença com paz, e acolheu com alegria a decisão dos carrascos de ser executado com seus paramentos sacerdotais. Revestido, pois, de amicto, alva, estola e casula, atravessou a cidade até o local onde se erguia o sinistro cadafalso, que logo se tornaria para ele o pórtico da eterna bem-aventurança.
Narra o padre Gruget, testemunha ocular do fato: "O mártir rezava em profundo recolhimento. Sua fisionomia estava calma e em sua fronte serena resplandecia a alegria dos eleitos. Podia-se, por assim dizer, acompanhar os cânticos de ação de graças que brotavam de seu coração".6
Junto à guilhotina, antes de pisar no primeiro degrau da escada, elevou os olhos e, tomado de sobrenatural entusiasmo, exclamou: "Introibo ad altare Dei! - E me aproximarei do altar de Deus" (Sl 42, 4).
Com estas palavras iniciava-se a Missa na antiga Liturgia, e o padre Pinot as pronunciara incontáveis vezes antes de subir os degraus do altar. Mas agora galgava o patíbulo para fazer a imolação de si mesmo, o holocausto derradeiro de sua vida! O sangue do servo misturar-se-ia ao do Senhor, como as gotas de água que, no Ofertório, o celebrante mescla ao vinho para se tornarem, com este, uma única bebida de salvação.
Subiu com passo firme, pressuroso de encontrar-se com Deus. Num instante a lâmina da guilhotina executou sua tarefa,
interrompendo sua vida terrena e fazendo-o nascer para o Céu. Era o dia 21 de fevereiro de 1794.
Noël Pinot acabava de render o espírito ao Criador. Alma sacerdotal, compenetrada da dignidade de sua missão; alma inteiramente cônscia de ser mero instrumento nas mãos de Deus, desempenhando com humildade seu ministério; alma esquecida de si mesma para só fazer brilhar seu caráter sagrado; alma de fogo, sempre arrastando os outros para o bem; alma que soube antepor os direitos da Igreja a seus interesses pessoais ainda que isso lhe custasse à própria vida!
Com sua morte, legou à posteridade um insigne memorial de heroísmo e santidade, "um nobre exemplo de zelo generoso, segundo o qual é preciso dar a vida pelas santas e veneráveis Leis" (II Mac 6, 27). - Revista Arautos do Evangelho, Fevereiro/2014, n. 146, p. 32 à 35. (Cf. http://www.acnsf.org.br/article/56567/Beato-Noel-Pinot---ldquo-Introibo-ad-altare-Dei-rdquo-.html.)
Fontes:
- https://it.wikipedia.org/wiki/No%C3%ABl_Pinot (italiano).
- http://www.religionenlibertad.com/el-beato-nol-pinot-y-los-martires-de-rochefort-35880.htm (espanhol).
- http://www.santiebeati.it/dettaglio/92241 (italiano).
- http://www.acnsf.org.br/article/56567/Beato-Noel-Pinot---ldquo-Introibo-ad-altare-Dei-rdquo-.html.
- https://www.facebook.com/ursularmcrc/posts/1303737992975173.
Tradução: Giulia d'Amore
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