A época dos Macabeus,
figura da situação atual da Igreja
Padre José Maria Mestre
“Todas as coisas que se escreveram, se escreveram para nosso ensinamento, a fim de que, mediante a paciência e o consolo das Escrituras, conservemos a esperança”. (Rom. 15,4)
Matatias mata o judeu apóstata clique na imagem para ampliá-la |
Propomo-nos,
assim, aplicar em breves traços o tema deste livro inspirado à crise atual da
Igreja, também em dois pontos:
Antes de tudo,
descrevendo a situação provocada no seio da Igreja, por esta pretender aceitar
os princípios do homem moderno, racionalista, independente de Deus; e, consequentemente,
destacar os remédios que a Providência legou à Sua Igreja: Para uma situação
semelhante à dos Macabeus, remédios análogos àqueles que então foram outorgados
pelo auxílio Divino.
I – Situação
descrita no Livro Inspirado e aplicação à nossa
Ensina-nos
este livro como foi poderoso o reino de Alexandre Magno, o qual chegou a ocupar
rapidamente o mundo então conhecido. Este Império impôs por todas as partes os
seus deuses e os seus costumes, com exceção do povo eleito, ao qual de início
respeitou. Todavia mais tarde, sob o rei Antíoco Epifânio, este Império
constituiu-se em perseguidor da verdadeira religião, bem como do povo que a
professava, o povo judeu. As coisas passaram-se da seguinte forma:
Por esse tempo
“apareceram uns iníquos israelitas que
persuadiram outros em grande número, para que se conformassem com os costumes
dos gentios, pois desde que se haviam deles separado, não haviam experimentado
mais que desastres”[2]. O
segundo livro dos Macabéus precisa que estes iníquos israelitas eram sobretudo
homens de estirpe sacerdotal. Muitos deixaram-se seduzir, então, pelas suas
propostas, e edificou-se então em Jerusalém um ginásio (símbolo do culto ao
homem), aboliu-se o uso da circuncisão e abandonou-se o conceito da Santa
Aliança.
-Vendo o rei
Antíoco que tanto Israel como os demais povos se haviam conformado com os seus
costumes, ensoberbeceu-se e editou um decreto para que todos os povos
abandonassem os seus costumes particulares e constituíssem um só povo. Foram
muitos no seio do povo de Israel que aquiesceram com este decreto; as consequências
foram que se sacrificou aos ídolos, se violou o sábado, se proibiu oferecer no
Templo de Deus holocaustos, sacrifícios e orações pelos pecados, profanaram-se
os lugares santos, despojando-os de todas as suas riquezas e vasos sagrados, proibiu-se
a circuncisão, permitindo-se que as gentes transgredissem os Mandamentos do
Senhor.
-Mas e o que
aconteceu com todos quantos não queriam submeter-se a estes decretos? O mesmo
livro nos diz que deviam perder a vida, ou serem perseguidos: as mulheres que
circuncidavam os seus filhos eram precipitadas das muralhas da cidade, os que
se refugiavam nas cavernas eram atacados em dia de sábado e exterminados; e
somos informados do martírio heroico de vários Israelitas por fidelidade à Lei
de Deus; entre eles o de sete irmãos instruídos e edificados pela sua mãe,
também com eles martirizada.
Será que todas
estas realidades não nos recordam a situação em que vivemos?
-Um reino
poderoso, orgulhoso e ímpio disseminou-se por toda a parte, o reino do mundo, o
reino da revolução, o reino da contra-Igreja. Muitos Israelitas, quer dizer,
muitos homens da Igreja, acreditaram que era necessário se conformarem a este
novo reino, com a desculpa de que muitos males proviriam desta falta de acordo
entre a Igreja e o mundo. Proclama-se a abertura ao mundo: num concílio,
aceitam-se oficialmente os ideais e os costumes deste novo Império: liberdade,
igualdade, fraternidade, direitos do homem.
Consequentemente,
abandona-se a Santa Aliança: renuncia-se à proclamação de que somente a Igreja
Católica possui a verdade, de que apenas no seu seio é possível a salvação;
revoga-se o sacrifício do Templo, e proíbe-se a continuação da oferenda, a Deus,
do holocausto e do sacrifício que Lhe era tão agradável: o Santo Sacrifício da
Missa. Tendo este último sido substituído por ceias, por sinaxis[3];
profanam-se os templos, espoliando-os e esbulhando- os de todas as suas
riquezas, das suas imagens, de tudo quanto possuía ressaibos de triunfalismo;
fazem-se decretos segundo os quais todos os povos hão de abandonar todos os
costumes e crenças particulares, que dividem, para não considerar senão aquilo
que os une, e constituir assim um só povo, uma só religião; e, como consequência
de tudo isto, trespassam-se todos os Mandamentos do Senhor, e a corrupção dos
costumes atinge níveis nunca antes conhecidos.
-E o que
acontece àqueles que não querem acatar este compromisso com o novo Império, que
pretendem simplesmente serem fiéis à Fé dos seus antepassados? Pois são
perseguidos, tratados como excomungados, como rebeldes; encerram-se-lhes as
igrejas, e veem-se constrangidos a viver separados de todos os demais.
II – A reação
contra tais situações
Surge então um
homem de linhagem sacerdotal, Matatias[4], O
QUAL SE NEGA A PROCEDER COMO TODOS OS OUTROS: “Ainda que todas as gentes obedeçam ao rei Antíoco, e todos abandonem a
observância da Lei dos seus Pais, e se submetam aos mandatos do rei, eu, bem
como os meus filhos, e meus irmãos, obedeceremos à Lei dos nossos Pais. Não nos
é proveitoso abandonar a Lei e os preceitos do Senhor, para seguir outro
caminho”[5]. E
gritando: “Todo o que tenha zelo pela
Lei, e queira permanecer fiel à Aliança, siga-me”[6],
com os seus cinco filhos, também de linhagem sacerdotal como ele, foge para os
montes, onde começam a ser acompanhados por muitos que amavam a Lei e a
justiça. Formam-se, assim, pequenos batalhões de homens que empreendem a
destruição dos altares destinados aos ídolos, combatem os adversários da única
religião verdadeira e circuncidam os meninos que encontram incircuncisos.
Há que
assinalar que Matatias não travou os combates mais ásperos e duros, os quais
Deus reservava a seus filhos, especialmente a Judas e a Simeão; todavia
constituiu os fundamentos desse prélio, iniciando a reação e indicando os
princípios de fidelidade que haviam de ordenar o procedimento futuro, mostrou o
caminho que teria de ser percorrido, formou e instruiu, encorajou e estimulou a
todos aqueles que almejavam serem fieis à Lei de Deus, assegurando para os seus
cinco filhos a continuidade do combate. Antes de morrer, Matatias reuniu junto
a si os seus cinco filhos e admoestou-os dizendo: “Ó filhos meus, permanecei zelosos da Lei, e entregai vossa vida em
defesa do Testamento dos vossos Pais”[7].
Judas Macabeu, filho de Matatias |
É certo que
não são mais do que um pequeno grupo (mais uma vez verificamos que o número não
é critério da verdade); todavia tenhamos na devida conta as muito sábias
palavras de Judas Macabeu: “Como
poderemos nós pelejar contra um tão grande e valoroso exército, sendo, como
somos, tão poucos?”[8]
perguntavam-lhe. “Quando o Deus dos Céus
quer conceder a vitória, é para Ele o mesmo que haja muitos ou haja poucos;
porque o triunfo nos combates não depende da multidão das tropas, mas de Deus.
Nós pelejamos pela Lei do Senhor; o Senhor mesmo despedaçará os nossos inimigos
na nossa presença, não os temais”[9].
Desta forma, Judas logrou inspirar enormíssimo temor e respeito aos seus
inimigos, bem como aos prevaricadores da Santa Aliança.
Não é verdade
que todas estas realidades nos recordam as vicissitudes que estamos
presentemente a viver? E, como a nossa situação é parecida com a dos Macabeus,
Deus suscitou uma reação semelhante.
E, tal como no tempo dos Macabeus, ainda que sejam relativamente poucos os sacerdotes e fiéis que guardam a Tradição, têm conseguido impor a atenção e o respeito de todos os prevaricadores, que universalmente os temem. Não há nada que um bispo ataque tanto hoje em dia como a presença da Fraternidade São Pio X na sua diocese. Não há nada que tanto moleste a Roma ecumênica como os contínuos protestos e censuras da Fraternidade.
Um novo
Matatias, de linhagem sacerdotal, Monsenhor Lefebvre, afirma tal como o
primeiro Matatias: “Ainda que todos
obedeçam ao espírito do mundo e aos seus ideais, eu não o servirei, muito pelo
contrário, obedecerei à Lei dos meus Pais; não abandonarei a Lei de Deus para
seguir outro caminho. Todo aquele que nutra zelo pela Lei de Deus e Sua Igreja
e queira permanecer na Fé – siga-me!”. Muitos o seguiram e, formando grupos
pouco numerosos, mas valentes, reuniram-se ao seu redor para conservar a Fé
(bonita definição dos nossos priorados). Certo é que a Monsenhor Lefebvre não
lhe tocaria sustentar a parte mais rude do combate, que Deus está reservando
para nós; todavia não é menos certo que Monsenhor Lefebvre assinalou e
personificou de tal forma as pautas de fidelidade à Igreja de sempre, que
continua sendo, mesmo depois da sua morte, a referência para quem quer ser fiel
à Tradição.
Como no tempo
dos Macabeus, a primeira atitude assumida por Monsenhor Lefebvre foi a de
combater os falsos sacrifícios ecumênicos, a nova missa, estabelecendo e
reconstituindo em todo o lado o holocausto e sacrifício abolido pelos homens
ímpios – O SANTO SACRIFÍCIO DA MISSA DE SEMPRE. Para poder assegurar no seio da
Igreja este sacrifício perpétuo, impunha-se a formação dum clero santo,
alimentado com a doutrina de sempre e pleno do espírito de Igreja. A isso
dedicou toda a sua vida, fundando a Fraternidade
Sacerdotal São Pio X, edificando Seminários nos cinco continentes. Ao
falecer, este novo Matatias confiou a luta a quatro dos seus filhos, também de
linhagem sacerdotal – os quatro bispos por ele consagrados.
Matatias Macabeu e S. E. Mons. Marcel Lefebvre clique na imagem para ampliá-la |
E, tal como no tempo dos Macabeus, ainda que sejam relativamente poucos os sacerdotes e fiéis que guardam a Tradição, têm conseguido impor a atenção e o respeito de todos os prevaricadores, que universalmente os temem. Não há nada que um bispo ataque tanto hoje em dia como a presença da Fraternidade São Pio X na sua diocese. Não há nada que tanto moleste a Roma ecumênica como os contínuos protestos e censuras da Fraternidade.
III –
Conclusão
Todas estas
realidades deverão constituir para nós um precioso ensinamento, e
simultaneamente uma grande esperança. O exemplo dos Macabeus demonstra-nos que,
perante a atual situação da Igreja, a nossa forma de resistir, com o objetivo
de conservar a Fé e o Santo Sacrifício da Missa, é aquela que Deus nos
solicita; demonstra-nos que é de somenos importância que sejamos pouco
numerosos, que sejamos excluídos das Igrejas e tratados como excomungados ou
cismáticos; demonstra-nos o zelo com que devemos estar munidos na defesa dos
interesses de Deus e da Sua Igreja; demonstra-nos, finalmente, a certeza que
possuímos na nossa vitória, pois que pelejamos pela Lei de Deus e sob Suas
ordens, e Deus não pode deixar de facultar-nos o Seu amparo.
O Padre José
Maria Mestre Roc, sacerdote da Fraternidade São Pio X, ordenado em 1989, é
atualmente professor no Seminário de língua espanhola, Nossa Senhora
Corredentora, na localidade de La
Reja (Argentina).
Fonte: Revista “Semper” – Priorado da FSSPX em Lisboa, Portugal.
Revisão: Giulia d'Amore di Ugento
Revisão: Giulia d'Amore di Ugento
[1]
NdRª:
O Primeiro Livro dos Macabeus,
também conhecido como I Macabeus, é
um dos livros deuterocanônicos do Antigo Testamento da Bíblia católica. Possui
16 capítulos. Os dois livros dos Macabeus são assim denominados por causa do
apelido do mais ilustre filho de Matatias, Judas chamado o Macabeu (I Mc 2,4) (‘Martelo’).
Os livros não constam na Bíblia Hebraica e são considerados apócrifos pelos
judeus e pelas Igrejas protestantes. Na Igreja Católica foram incluídos nas
listas dos sete livros deuterocanônicos. O tema geral dos dois livros é o
mesmo: descrevem as lutas dos judeus, liderados por Matatias e seus filhos,
contra os reis sírios (selêucidas) e seus aliados judeus, pela libertação
religiosa e política da nação, opondo-se aos valores do helenismo. O Primeiro Livro dos Macabeus ocupa-se de
um período mais amplo da guerra de libertação do que o Segundo Livro dos Macabeus. Começa com a perseguição de Antíoco Epifânio
(175 a.C.) e vai até a morte de Simão (134 a.C.), o último dos filhos de
Matatias. Depois de uma breve introdução sobre os governos de Alexandre Magno e
seus sucessores (1,1-9), o autor passa a mostrar como Antíoco Epifânio tenta
introduzir à força os costumes gregos na Judéia (1,10-63). Descreve a revolta
de Matatias (2,1-70), cuja bandeira da libertação passa primeiro a Judas
Macabeu (3,1-9,22), depois a seu irmão Jônatas (9,23-12,53) e por fim a Simão
(13,1-16,24). Graças a estes três líderes, a liberdade religiosa é recuperada,
o país torna-se independente por um breve período e o povo torna a gozar de paz
e tranquilidade. O livro é considerado uma prova do cumprimento das profecias
do Livro de Daniel. - Wikipedia.
[2] NdRª:
1Macabeus
1,12.
[3] NdRª:
palavra
grega que significa ‘assembleia de cunho religioso’.
[4] NdRª:
Matatias (מתתיהו Matitiyahu ou Matisyahu ben Yochanan HaCohen em Hebreu) foi um
grande sacerdote do templo Judeu, de quem é contada a história nos Livros dos Macabéus. É o pai de Judas
Macabeu, o líder dos Macabeus. Em 170 AC, quando o rei sírio (selêucida) Antióco
IV lhe ordenou que oferecesse sacrifício aos deuses gregos, ele não apenas
recusou mas matou com as suas próprias mãos alguém que avançou para o matar. Depois
de ter sido ordenada a sua detenção, ele se refugiou no deserto da Judéia com
os seus 5 filhos, sendo seguido por muitos dos seus compatriotas. Este foi o
primeiro episódio da guerra dos Macabeus contra o império selêucida, que
resultou na independência dos Judeus após 400 anos de domínio estrangeiro. Os
eventos da guerra dos Macabeus formam a base para o feriado da Chanucá ou
Hanucá, celebrado pelos Judeus a 25 de Kislev do calendário judaico, o que
corresponde a um período entre meados de Novembro e fins de Dezembro, no
Calendário Gregoriano. - Wikipedia.
[5] NdRª:
1Macabeus
2,19.
[6] NdRª:
1Macabeus
2,27.
[7] NdRª:
1Macabeus
2,50.
[8] NdRª:
1Macabeus
3,17.
[9] NdRª:
1Macabeus
18,19-21,22.