Reproduzo abaixo a entrevista concedida por Mons. Pozzo, Secretário da Pontíficia Comissão Ecclesia Dei ao site Gloria.TV. Nela, Mons. Pozzo explicita a visão pessoal dos colóquios e o status quo das relaçãos FSSPX-Roma. Grifei aspectos que eu achei particularmente interessantes. O conteúdo do discurso de Mons. Pozzo é tipicamente pós-conciliar, um tanto trapizonga. Polido e superficial, querendo parecer discreto. Mas o que conta aqui não é minha opinião sobre Monsenhor, mas o que ele próprio diz. Vamos à entrevista, então.
O chefe da Ecclesia Dei acerca dos colóquios com a FSSPX
Entrevista de Gloria.TV a Mons. Guido Pozzo, Secretário da Pontifícia
Comissão Ecclesia Dei
- Monsenhor, o senhor participou do diálogo com a
Fraternidade Sacerdotal São Pio X. Qual foi sua impressão pessoal dessas
reuniões? Em que ponto estamos? Crê que chegaremos logo a uma reconciliação?
Minha impressão é substancialmente positiva quanto à
cordialidade com que o diálogo, o colóquio se desenvolveu, e devo dizer que
sempre foi um diálogo muito franco, sincero e, por vezes, vivaz, como era de se
esperar, dada a problemática e a temática em discussão. Penso que chegamos a um
ponto decisivo, mesmo que, certamente, não conclusivo deste caminho, e que serviu
para esclarece amplamente e de modo aprofundado as posições respectivas da Fraternidade
São Pio X e dos especialistas da Congregação pela Doutrina da Fé; agora,
trata-se justamente de passar a um patamar mais valorativo, a um nível
valorativo dos pontos controvertidos, para verificar a possibilidade concreta de
chegar à superação das dificuldades doutrinais que foram afrontadas.
- Existe um modus
procedendi, caso o Preâmbulo doutrinal não venha a ser firmado?
Nesta fase, o texto do Preâmbulo doutrinal foi entregue a
Mon. Fellay, aos superiores da Fraternidade, para que eles possam examiná-lo e
dar uma resposta, que nós auspicamos seja em substância favorável, positiva,
afirmativa. Há sempre a possibilidade de pedir certos detalhamentos, certos
esclarecimentos, que de nossa parte serão certamente dados, dentro de um lapso de
tempo razoável [ou seja: algumas modificações no texto do Preâmbulo, NdR]. Questionar-se
o que vai acontecer se as dificuldades viessem a ser consideradas graves, intransponíveis,
parece-me que seja impróprio. Neste momento, não nos colocamos este problema.
- A Fraternidade não surgiu do nada, mas como resposta a uma
gravíssima crise eclesiástica, sobretudo em países como a Alemanha, a França ou
a Suíça. Esta crise persiste. Crê que, depois de um acordo feito em Roma, a Fraternidade
possa coabitar nestes Países debaixo do teto da Igreja institucional?
Eu responderia simplesmente que quem é verdadeira e
plenamente católico pode habitar plena e devidamente na Igreja Católica, onde
quer que a Igreja Católica exista e se desenvolva. Não é apenas uma afirmação
de princípio, é uma afirmação existencial que corresponde à realidade da Igreja
Católica. Isto, naturalmente, não significa que não existam dificuldades, até
por causa da situação crítica em que se encontram muitos católicos, o mundo
católico, nestes e em outros países, mas não creio que na história não se
verificaram casos análogos, e, portanto, a resposta é muito simples: quem é verdadeira
e plenamente católico não apenas tem o direito, mas vive bem e se encontra bem
dentro da Igreja Católica.
- Quais são as razões da hostilidade de muitos ambientes eclesiásticos
contra uma liturgia que a Igreja e muitíssimos santos celebraram por um período
tão longo e que foi o instrumento do crescimento espetacular da Igreja? [esta é
a pergunta que muitos de nós se põem. Na realidade, não pode haver uma resposta
satisfatória, pois a razão é visceral, não racional: uma inteira geração de
sacerdotes sofreu uma capilar, penetrante, totalitarista lavagem cerebral, motivo
pelo qual tudo o que se fazia até 1962 era retrógrado e errado; é quase impossível,
agora, reparar os danos cerebrais causados por aquele condicionamento pluri-decenal,
NdR].
É uma pergunta complexa porque acredito que muitos fatores intervêm
para compreender este preconceito ainda tão difundido contra a liturgia da forma
extraordinária do Rito Antigo. É de se ter em mente que, por muitos anos, não
foi oferecida uma formação litúrgica verdadeiramente adequada e completa na Igreja
Católica. Quis-se introduzir o princípio de uma ruptura, de um afastamento, de
um distanciamento radical entre a reforma litúrgica proposta, instaurada,
promulgada pelo Papa Paulo VI e a liturgia tradicional. Na realidade, as coisas
são diferentes, porque é claro que há uma continuidade substancial na liturgia,
na história da liturgia; há crescimento, progresso, renovação, mas não ruptura,
não descontinuidade; e, então, estes preconceitos influenciam de maneira determinante
na forma mentis das pessoas, dos eclesiásticos
e também dos fieis [os fieis e os eclesiásticos não seriam pessoas? NdTª]. É necessário
superar este preconceito, é necessário dar uma formação litúrgica completa, autêntica,
e ver como, precisamente, uma coisa são os livros litúrgicos da reforma quista
por Paolo VI e outra coisa são as formas de atuação que em tantas partes do
mundo católico aconteceram na prática e que são autênticos abusos da própria
reforma litúrgica de Paulo VI, e contêm inclusive erros doutrinais que devem
ser corrigidos e rejeitados. É isto que, recentemente, no fim da primavera deste
ano, em um discurso no Ateneo Anselmiano, o Santo Padre Bento XVI quis mais uma
vez reafirmar. Uma coisa são os livros litúrgicos da reforma, outra as formas
concretas de atuação que, infelizmente, em tantas partes se difundiram e que
não são coerentes com os princípios que foram fixados e explicitados pela
própria Constituição do Concílio Vaticano II, "Sacrosantum Concilium",
sobre a divina liturgia.
- O Preâmbulo confidencial foi entregue a Mons. Fellay em 14
de setembro. Um dia depois, Andrea Tornielli estava já informado a respeito. Por
que as informações confidenciais do Vaticano chegam tão rapidamente à imprensa?
A habilidade dos jornalistas é muito conhecida, é uma
habilidade de interceptar as notícias que é realmente admirável sob certo ponto
de vista, mas diria que neste caso os jornalistas, não apenas o jornalista Tornielli
mas outros também, no dia seguinte haviam capturado a essência [A. Tornielli não disse que capturou alguma essência, afirmou que recebeu informações intra muro, NdTª] do comunicado de imprensa que já informava sobre alguns elementos essenciais do Preâmbulo
doutrinal, e, então, diria que os conteúdos profundos do Preâmbulo, em seus detalhes,
não são conhecidos, pelo menos até agora não foram divulgados; e os jornalistas
não falaram sobre eles, não descreveram em detalhes o desenvolvimento e a
elaboração do Preâmbulo doutrinal; então, a discrição, substancialmente, neste
caso, creio que foi mantida. Espero que continue assim.
- O senhor, antes de fazer parte de Ecclesia Dei, teve
experiências pessoais com a Missa em latim? Como viveu as mudanças litúrgicas nos
anos sessenta?
As perguntas são duas, e à primeira respondo que, antes do motu
proprio Summorum Pontificum de 2007, eu não tive nenhum contato com a
celebração da Missa no rito antigo, e comecei a celebrar a Missa no rito da forma
extraordinária justamente com o motu proprio Summorum Pontificum, que permitiu que
esta Missa pudesse ser celebrada desta forma.
Como vivi nos anos sessenta, nos anos setenta as mudanças? Bem,
devo dizer que, conforme o modo como fui formado e preparado pelos meus educadores
no Seminário, e, sobretudo, também na Pontifícia Universidade Gregoriana, pelos
meus mestres de teologia, procurei sempre entender aquilo que o Magistério propunha
através da leitura de seus textos, não através do que teólogos ou certa publicística
católica atribuía ao Magistério. Portanto, eu nunca tive problema em aceitar a
Missa pela reforma litúrgica de Paolo VI, mas logo percebi que, por causa desta
grande desordem que se introduziu na Igreja depois de 1968, frequentemente a
Missa de Paulo VI vinha sendo deformada e celebrada em modo absolutamente
contrário às intenções profundas do legislador, isto é, do Sumo Pontífice; portanto,
esta desordem, este colapso da liturgia de que falou o então Cardeal Ratzinger em
alguns de seus livros e em algumas de suas publicações de liturgia, eu até o
experimentei assaz diretamente e sempre quis manter separadas as duas coisas: uma
coisa são os ritos, os textos do missal, outra coisa é o modo como é celebrada,
ou era celebrada a liturgia em muitas circunstancias e em muitos lugares, sobretudo
com base neste princípio da criatividade, uma criatividade selvagem que nada
tem a ver com o Espírito Santo; pelo contrário, diria, que é exatamente o oposto
do que o Espírito Santo quer.
- Porque vale a pena promover a Missa em latim?
Porque na Missa do Rito Antigo são explicitados,
evidenciados certos valores, certos aspectos fundamentais da liturgia que merecem
ser mantidos, e não falo somente da língua latina ou do canto gregoriano, falo
do sentido do mistério, do sagrado; o sentido do sacrifício, da Missa como
sacrifício; a presença real e substancial de Cristo na Eucaristia, e do fato de
que há grandes momentos de recolhimento interior, como uma participação
interior à divina liturgia. É isto, são todos elementos fundamentais, os quais na
Missa do Rito Antigo são particularmente evidenciados. Não digo que na Missa da
reforma de Paulo VI não existam estes elementos, mas falo de uma evidenciação
maior, e isto pode enriquecer também quem celebra ou participa da Missa na
forma ordinária. Nada proíbe de pensar que no futuro se possa chegar inclusive
a uma reunificação das duas formas com elementos que se integram entre si, mas
este não é um objetivo para se alcançar em curto espaço de tempo, nem, sobretudo,
para se alcançar com uma decisão tomada levianamente, mas requer uma maturação
de todo o povo cristão em compreender ambas as formas litúrgicas do mesmo rito romano.
Obs.: NdR é MessaInLatino. NdTª sou eu. Grifos [negrito] no textos são meus.
Vídeo: Gloria.TV
Fonte: MessaInLatino
Tradução: Pale Ideas
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