Exame de Consciência dum Cristão Medíocre
Jacques Debout |
Da
omissão em si mesma
Eu
acuso-me de ter omitido os meus pecados de omissão; de me ter contentado com o
mal que não cometi para levar comigo na eternidade; de ter considerado a moral
cristã unicamente como uma mortificação e
não como uma vida, como uma mutilação e não como uma expansão, como um travão e não como um impulso de progresso,
como um muro de resguardo e não como um trampolim.
Eu
acuso-me de ter olhado o bem a fazer como um dever bastante impreciso,
preferencialmente facultativo e depressa cumprido, de me ter persuadido que a
cólera eterna de Deus era unicamente provocada pela impiedade e pelos pecados contra a santa
virtude; de ter batizado como
bom Cristão um senhor que vai à Missa ao Domingo, cumpre o preceito pascal e de
maneira nenhuma dá ocasião a que falem dele; de ter considerado excelente Cristão
o senhor que recebe o clero à sua mesa e leva um círio na procissão, e de cristão, como eram
necessários muitos, aquele senhor que, dentro de casa, protesta ruidosamente
contra os inimigos da ordem e da sã doutrina.
A omissão de adorar na oração
Eu
acuso-me de ter olvidado que a oração é uma adoração, de não ter compreendido
que é necessário que o Nome de Deus seja santificado, que
o Seu Reino chegue, e que a Sua vontade seja cumprida antes que Ele nos
conceda, ou melhor, a fim de que Ele nos conceda o nosso pão.
Eu
acuso-me de ter inquietado a Deus com os meus interesses, sem previamente eu me
ter ocupado dos Seus.
Eu
acuso-me de ter invocado a Deus à maneira dos pagãos, unicamente para obter êxitos e curas,
sobretudo quando, encontrando-se esgotados os meios humanos, a intervenção
sobrenatural surgia, ou como um trunfo a mais no jogo, ou como a última carta a
jogar.
A oração pela sua alma
Eu
acuso-me, portanto, de não ter possuído o cuidado da minha beleza sobrenatural;
de não ter solicitado a Deus esta delicadeza, este esmero espiritual, o qual
constitui a forma requintada do Amor Divino; acuso-me de apenas haver
solicitado a Graça da Salvação, e não a graça para ser belo e bom segundo a
beleza e a bondade Divinas, vivendo a Sua Vida sobrenatural; acuso-me de não
haver visto na Graça senão um para-raios e não a veste nupcial, apenas uma garantia e não um valor
positivo.
Eu
acuso-me de não ter deplorado a minha impureza senão como um perigo e não como
uma vilania; o meu egoísmo apenas como erro de cálculo e não como uma
enfermidade; o meu orgulho como uma desordem e não como uma deformidade.
Acerca
do valor da oração
Eu
acuso-me de não haver acreditado profundamente no poder da oração; de nela não
ter acreditado senão à força de nervos, sob a pressão da angústia e como um
meio desesperado; de ter rezado sem fervor e simplesmente para não perder Deus,
último recurso, assim eu me possa fiar nos meus recursos, nos meus cálculos,
nas minhas oportunidades.
Eu
acuso-me de ter procurado a Providência quase unicamente na minha própria atividade; de não haver compreendido que a minha ação, para ser forte, feliz e útil, tem
necessidade que o Senhor edifique o
lar e guarde a cidade; eu acuso-me de não ter compreendido que aqueles que
rezam obram mais pelo mundo do que aqueles que trabalham, e que Josué fraqueja
no combate quando esmorecem na oração os braços erguidos de Moisés.
Eu
acuso-me de nunca me ter acusado de ignorância religiosa, de nem dela me
desculpar, a tal ponto esta ignorância me parece normal; acuso-me de ter sido
levado a pensar que a docilidade me
dispensava da ciência, que esta pobreza de espírito predispunha para o Reino de
Deus e que seria perigoso ultrapassar a Fé do carvoeiro.
Eu
acuso-me de me ter completamente desinteressado da Doutrina Cristã, sob
pretexto de assim nela mais respeitar os mistérios e o carácter sagrado; de ter sido, aliás,
persuadido que o dever é de essência exclusivamente prática; que no domínio
intelectual não existe outra obrigação senão obedecer; que para ser um bom Cristão
é necessário observar os Mandamentos de Deus, bem como os da Santa Igreja, que
é suficiente recitar o Símbolo dos Apóstolos, e mesmo de saber responder ‘Amém’.
Jacques
Debout
Fonte: Revista “Semper” – Priorado da FSSPX em Lisboa, Portugal.
* Jaques Debout, cujo nome canônio é René Roblot, 1872-1939, foi um religioso e um homem de letras francês. Ele também usou o pseudônimo de John St. Clair.
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