Do
escândalo ou sedução
Maria Addolorata - Paul e Peter Strudel |
Do
escândalo direto
Há escândalo direto quando se induz o próximo ao mal, aconselhando, ajudando, mandando, aprovando ou aplaudindo. Quem deliberadamente induz o próximo a pecado grave, peca gravemente contra a caridade e contra o preceito ou virtude a cuja violação o induz. Quem aconselhar outro a cometer um furto, deve na confissão declarar «induzi o meu próximo a furtar», e acrescentar logo a qualidade e quantidade do furto.
O amo que
sem justo motivo induz os criados ou operários a trabalhar ao domingo e dias de
festa, peca, e deve dizer na confissão que obrigou seus súditos a trabalhar em
dia de festa de preceito.
É
evidente que uma coisa é induzir o próximo a roubar e outra a jurar falso; uma
coisa é levá-lo a trabalhar ao domingo; outra violar a castidade; e por isso na
confissão se deve declarar qual a espécie de pecado que se induziu alguém.
Do
escândalo indireto
Há
escândalo indireto, quando, não havendo intenção de induzir o próximo a pecar
se faz ou omite, sem justo motivo e causa suficiente, qualquer coisa que se
prevê irá servir de ocasião de pecado ao nosso semelhante.
É
escândalo indireto falar mal dos superiores eclesiásticos e civis; porque de
tais palavras se segue nos que as ouvem, o desprezo da autoridade, e com o
desprezo vem a perda de influência da mesma autoridade e o desprestígio da
Religião.
Dá
ocasião ao pecado, e por isso escandaliza, quem distribui livros maus, imagens
indecentes. Este escândalo será direto ou indireto, segundo houve ou não
intenção de induzir os outros a pecar ou apostatar da fé.
Se houve
tal intenção, além do pecado de escândalo, também se pecou contra a caridade
num caso, e no outro contra a fé.
O
escândalo indireto também pode nascer do mau exemplo. De fato, não poucas vezes
o nosso mau exemplo arrasta os outros ao mal e enfraquece, se não é que de todo
apaga nas almas débeis e frouxas, todo o temor do pecado.
Essas almas
facilmente raciocinam dessa forma: «Se os outros não fazem caso desse ou
daquele pecado, para que hei-de eu ser escrupuloso onde os outros não vêem
motivo de reparo? Não serei eu o primeiro nem o último a fazer isto». É, pois,
inegável a sedução e perniciosa influência do mau exemplo. Essas almas tenras e
débeis nunca cometeriam tais pecados, se não fossem os maus exemplos que lhes
deram.
Trabalhar
nos dias de festa sem necessidade e em lugar onde todos podem ver, transgredir
publicamente o preceito da abstinência, é dar ocasião de que outros cometam as
mesmas faltas e por isso é escândalo. É também escândalo pronunciar más
palavras, rogar pragas diante de crianças, porque tomam daí ocasião de as
aprender e de contrair o mau costume de as repetir.
Outra
coisa será transgredir os citados preceitos ou pronunciar essas más palavras
diante de cristãos fervorosos, que com certeza se não deixarão arrastar do mau
exemplo; ou de maus cristãos, que, sem o mau exemplo, já transgridem esses
preceitos e já têm o mau costume de profanar os nomes santos. Nestes casos o
mau exemplo não seria ocasião de pecado, e por isso não se juntaria o pecado de
escândalo aos pecados que foram cometidos.
Malicia
do escândalo indireto
A vida da
alma é muito mais nobre e preciosa do que a do corpo. Se temos obrigação de não
danificar a esta, muito mais a temos de não prejudicar aquela.
Portanto
falta se ao amor do próximo, se, sem motivo, se lhe dá ocasião de pecar.
Dar
ocasião a faltas leves dos outros, é pecado venial. Se não se advertiu na
malicia de ato gravemente escandaloso, o pecado será ainda leve. E quem não
conhece nem sabe que dá escândalo, não comete pecado algum.
E
necessário evitar o escândalo a todo o custo, e não dar ao próximo ocasião de
pecado nem mesmo venial. Se, para tanto, fosse preciso omitir uma ação de si
indiferente, ou mesmo boa, ou até às vezes prescrita pela Igreja, teríamos
obrigação de omiti-la para evitar o escândalo.
Vejamos
alguns exemplos: Uma pessoa sabe por experiência que sua presença num passeio
público em determinadas circunstâncias é ocasião de pecado grave para outra. A
caridade cristã exige-lhe que durante algum tempo não apareça em tal passeio,
se o puder fazer sem grave incômodo.
Disse
«por algum tempo», e «sem grave incômodo», porque ninguém está obrigado a
privar-se dum passeio honesto por muito tempo, o que de per si seria incômodo
grave e um sacrifício extraordinário que Deus não exige de nós para evitarmos
os pecados dos outros.
Animado
de sincero e ardente desejo de perfeição, desejarias receber freqüentemente os
Sacramentos, mas prevês que teu procedimento dará aso a escárnios contra a
religião e a calúnias contra ti ou outras pessoas. Que fazer?
Procura,
se podes, com prudentes e ajuizadas observações prevenir o escândalo. Se nada
conseguires podes deixar os Sacramentos, se prevês, que será este o meio eficaz
de evitar o escândalo. Mas isto uma ou duas vezes, e não por muito tempo,
porque a caridade bem ordenada começa por nós; e seria loucura, a pretexto de
não prejudicar a alma do próximo, causar grave dano espiritual a ti mesmo. Do
mesmo modo, para evitar o escândalo e a ocasião certa de alguém cometer pecado
grave, por exemplo, contra a castidade, poderás uma vez por outra deixar de
assistir à missa de obrigação. E se para evitar o escândalo se vai até omitir
obrigações, com maior razão se deverá ir até omitir certas ações de si
indiferentes ou mesmo boas.
No caso
de haver motivos justos e particulares para fazer qualquer coisa de que o
próximo se vai escandalizar, devemos explicar o motivo do nosso procedimento,
ou, se for possível, esperar melhor ocasião para fazermos o que desejávamos.
É dia de
abstinência e vais comer carne publicamente porque estás dispensado do
preceito: Tens de explicar aos que estão presentes, os motivos do teu proceder.
Impossível
seria, mesmo com a melhor boa vontade, evitar ao próximo toda a ocasião de
pecado. Nunca faltarão olhos perversos que vejam ou finjam ver ocasião de
pecado nas mais santas das nossas ações.
O Divino
Salvador foi acusado de escandaloso pelos judeus; e os fariseus até dos seus
milagres a favor dos que sofriam, tomavam motivo de escândalo. Para evitar
escândalos assim, seria preciso, como disse S. Paulo aos Coríntios, andar fora
deste mundo. De nenhum modo, por exemplo, estarás obrigado a sujeitar-te às
exorbitantes exigências dum artista ou operário, embora prevejas que vai romper
em pragas e imprecações.
Ao
prejuízo que sofrias, acrescia ainda dares-lhes ansas para na vez seguinte mais
exorbitar. Os pais podem e devem corrigir seus filhos, mesmo quando prevêem que
se vão zangar ou amuar.
Antes
esses seus arrebatamentos ou amuos, do que ficarem com o caminho aberto para
faltas mais graves.
E para
terminar, advertimos que nem sempre o autor do escândalo indireto está obrigado
na confissão a declarar expressamente que escandalizou.
Acusa-se
alguém, por exemplo, de ter dito palavras obscenas diante de crianças. Não
precisa de dizer mais nada; já assim vai tudo confessado, pois sempre as
crianças se escandalizam quando ouvem conversas desonestas.
Também
pela mesma razão não é obrigado a declarar o pecado de escândalo quem se acusa
de ter trabalhado publicamente no domingo.
«O que
escandalizar a um destes pequeninos que crêem em Mim, melhor lhe fora que se
lhe dependurasse ao pescoço uma mó de atafona e o lançassem no fundo do mar.
Ai! do mundo por causa dos escândalos! Ai daquele homem por quem vem o
escândalo!» (Mat. 18,6-7) Duras e terríveis, estas palavras do Salvador, sempre
todo mansidão e doçura! Pensa, porém, no que é o escândalo e nas suas terríveis
conseqüências, e compreenderás a dureza do Seu falar.
O
escandaloso é verdadeiro assassino, no diz de Santo Agostinho: «quem dá escândalo,
é um assassino», porque mata a vida da alma. Por isso a Escritura chama ao
demônio «homicida desde princípio». O demônio foi o primeiro sedutor e o pai de
todos os sedutores e escandalosos, seus instrumentos e auxiliares e em tudo
seus semelhantes, quando procuram arrastar à perdição as almas puras e
inocentes.
Mas o
crime do escandaloso vai mais longe.
Um só
pecado de escândalo pode ser causa da ruína espiritual de centenares de
pessoas. Escandalizaste a uma pessoa, esta a outra, e assim por ai fora; e foi
o teu pecado a causa remota de todos estes pecados. Sucederá até, que, morto o
escandaloso, sepultado de há muito, esquecido pelos homens o seu nome, continue
ainda a ser causa da ruína de muitas almas. A semente por ele lançada à terra
germinou, cresceu e produziu frutos de morte eterna, entre os homens!
Não te
iludas, parecendo-te que o escândalo e coisa de pouca monta; nem o consideres
ao de leve. Examina com cuidado se tens dado escândalo, onde e de que modo.
Suposto mesmo que não tenhas sido absolutamente responsável diante de Deus
porque não advertiste no pecado ou nas suas conseqüências, procura reparar do
melhor modo possível, e evitar completamente para o futuro, todo o escândalo.
"Não percas aquele por quem Cristo morreu». (Rom. 14,15)
Se
conheceres que alguém arma ciladas à tua virtude, ou que sua amizade é perigosa
para a tua alma, foge com o maior cuidado, porque também Jesus Cristo morreu
por ti sobre a Cruz...
Como se
há-de reparar o escândalo
Aquele
que, sem justo motivo, deu ao próximo ocasião de pecar, está obrigado a
reparar, quanto puder, o dano espiritual que lhe causou. Se, por tua culpa,
alguém se apartou do caminho do bem, cuida por todas as maneiras de o trazer de
novo à virtude, exortando-o, instruindo-o, orando por ele e dando-lhe bom
exemplo. Que ele veja nas tuas palavras e obras, que repudias todo o mal que
fizeste e dele estás arrependido de todo o teu coração.
O melhor
meio de reparar o mal, será converteres-te de pedra de escândalo que eras pelo
teu mau exemplo, em pregador mudo, mas eloqüente da virtude pela tua vida
exemplar e verdadeiramente cristã.
Nas
dúvidas que te ocorrerem sobre qualquer ponto particular, aconselha-te com o
teu confessor.
(O
Cristão no tribunal da Penitência, pelo P. Frutuoso Hockenmaier, O.F.M, 1949.)
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