O Bom Exemplo
No sermão da montanha o divino Mestre chama a seus apóstolos o “sal da terra” e a “luz do mundo” (Mt. 5, 13-14).
Seremos
“sal da terra” na medida em que formos santos. O sal insípido para que
serve? “Que pode sair de puro de uma fonte impura?” (Ecli. 34, 4). Só
presta para ser atirado aos caminhos e calcado aos pés.
Verdadeiro
“sal da terra”, pelo contrário, o apóstolo piedoso será um verdadeiro
agente de conservação da sociedade, no meio da corrupção humana. Farol
que brilha durante a noite, o clarão do seu exemplo, mais ainda do que
da sua palavra, dissipará – omo verdadeira “luz do mundo” – as trevas
acumuladas pelo espírito do mundo, e fará resplandecer o ideal da
verdadeira felicidade, que Jesus traçou nas oito bem-aventuranças.
O
que mais favorece a prática da vida cristã são, precisamente, as
virtudes daqueles que têm a missão de ensinar os fiéis. Pelo contrário,
as suas fraquezas afastam as almas de Deus; “Por vossa causa o nome de
Deus é blasfemado entre os gentios” (Rom. 2, 24). O apóstolo deve ter
nas mão a tocha do bom exemplo, mais do que bonitas palavras nos lábios
e, antes de pregar a virtude, deve praticá-la. “Aquele que tem a
missão de dizer coisas sublimes é, por isso mesmo, obrigado a
traduzi-las na prática”, diz S. Gregório. (1)
Com
toda a razão alguém observou que o médico do corpo pode tratar dos
seus doentes sem que ele próprio goze de saúde. Porém, o médico de
almas deve ter a alma sã, porque dá alguma coisa de si mesmo. Os homens
têm o direito de ser exigentes com aqueles que pretendem reformá-los.
Com efeito, se a moral com que se orna o pregador mais não é do que um
invólucro falaz, logo o descobrem e recusam-lhe a confiança.
O
sacerdote terá grande poder para falar da oração, se o povo o vir
frequentemente em colóquios íntimos com o Hóspede do tabernáculo,
tantas vezes abandonado. Será ouvido ao pregar o trabalho e a
penitência, se ele próprio for laborioso e mortificado. Ao fazer
apologia da caridade fraterna, encontrará corações atentos, se difundir
à sua volta o bom odor de Jesus Cristo, reflectindo na sua conduta a
doçura e a humildade do divino Mestre, “como modelo do seu rebanho” (1
Ped. 5, 3).
O
professor sem vida interior julga ter cumprido o seu dever,
cingindo-se exclusivamente ao programa lectivo. Se tiver vida interior,
uma frase que lhe escape dos lábios, uma comoção que se lhe espelhe no
rosto, um gesto expressivo, a sua maneira de fazer o sinal da cruz, de
dizes uma oração, antes e depois da aula – mesmo que seja de
matemática – podem ser mais eficazes do que um sermão inteiro.
A
religiosa, em serviço de um hospital ou num asilo, tem poder e meios
eficazes para fazer germinar nas almas um amor profundo a Jesus Cristo e
ao Evangelho. Falte-lhe a vida interior, e nem sequer dará por esse
poder, ou conseguirá, apenas, promover actos exteriores de piedade.
O
cristianismo propagou-se menos pelos sermões e polêmicas, do que pelo
espetáculo dos costumes cristãos, tão opostos ao egoísmo, à injustiça e
à corrupção dos pagão. Na sua obra prima, “Fabíola”, o cardeal Wiseman
descreve bem o fascínio que o exemplo dos primeiros cristãos exerceu
sobre as almas pagãs mais carregadas de preconceitos contra a nova
religião. Nessa belíssima narração, assistimos à ascensão de uma alma
para a luz. Os sentimentos nobres, as virtudes modestas ou heróicas,
que a filha de Fábio descobre em certas pessoas de todas as classes
sociais, impõem-se à sua capacidade de admirar. Mas que a revelação
para a sua alma, quando verifica que todos aqueles cuja caridade,
dedicação, modéstia, doçura, moderação, culto da justiça e da castidade
ela admira, pertencem a essa “seita” que sempre lhe apresentaram como a
mais execrável! Desde aquele momento, torna-se cristã.
Como
seria irresistível o apostolado dos católicos sobre os pagãos
modernos, se possuíssem o esplendor de vida cristã descrito pelo
ilustre purpurado, e que afinal mais não é do que a fidelidade ao
Evangelho! Muitas vezes, contudo, a agressividade das nossas polêmicas,
ou a maneira de reivindicar direitos, mais parece provir do orgulho
ferido que do desejo de defender os interesses de Jesus!
A
irradiação exterior de uma alma unida a Deus é extraordinariamente
poderosa. Foi ao ver o modo como o Padre Passerat celebrava a santa
Missa, que o jovem Desurmont decidiu entrar na Congragação do
Santíssimo Redentor, que tanto haveria de ilustrar.
O
povo tem intuições que não falham. Pregue um homem de Deus e o povo
acode em multidão. Cesse porém a sua conduta de corresponder ao que se
tinha o direito de esperar, e logo a obra fica comprometida e ameaça
ruína.
“Que
vejam as vossa obras, e glorifiquem o vosso Pai, que está nos Céus”
(Mt. 5, 16), dizia Nosso Senhor. S. Paulo recomenda, frequentemente, o
bom exemplo aos seus discípulos Tito e Timóteo: “E tu serve de exemplo
em tudo pelo teu bom comportamento” (Tit. 2, 7). “Sê o exemplo dos
fiéis: Na palavra, no procedimento, na caridade, na fé e nas castidade”
(1 Tim. 4, 12). Ele próprio exclama: “O que vistes em mim é o que
deveis praticar” (Fil. 4, 9). “Sede imitadores meus, como eu o sou de
Cristo” (1 Cor. 11, 1). E a sua linguagem de verdade apoia-se nessa
segurança e nesse zelo que , de forma alguma, excluem a humildade e que
faziam dizer a Nosso Senhor: “Qual de vós me acusará de pecado?” (Jo.
8, 46).
É
tão somente quando seguir “as obras e os ensinamentos de Jesus” (Act.
1,1), que o apóstolo se tornará “um operário que não tem de que se
envergonhar” (2 Tim. 2, 15).
“Antes
de tudo, caríssimos filhos – dizia Leão XIII – lembrai-vos de que a
pureza e a santidade da vida são a condição indispensável do verdadeiro
zelo e o melhor penhor de vitória” (2).
“Um
homem perfeito e santo – diz Santa Teresa – faz maior bem às almas do
que grande número de outros, que apenas seja bem instruídos e
prendados”.
“Se
o espírito não for regulado por uma conduta verdadeiramente cristã e
santa – declara S. Pio X – difícil será levar os outros à prrática do
bem”. E acrescenta: “Aqueles que são chamados às obras católicas, devem
ser homens de vida tão ilibada que a todos sirvam de exemplo eficaz”.
(3)
Notas:
(1) São Gregório Magno, Pastor, 2 p, c. III);
(2)Encíclica de Leão XIII, de 8 de setembro de 1899;
(3) Encíclica de São Pio X, aos bispos da Itália, de 11 de junho de 1905.
Fonte: A Alma de todo apostolado – J.B. Chautard.
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