(27/09/1696 - 02/08/1787)
Bispo de Santa Àgata
Confessor
Doutor Zelosíssimo da Igreja
Fundador dos Missionários Redentoristas
Bispo de Santa Àgata
Confessor
Doutor Zelosíssimo da Igreja
Fundador dos Missionários Redentoristas
A Selva
SEGUNDA PARTE - MATERIAIS PARA AS INSTRUÇÕES
SÉTIMA INSTRUÇÃO
Sobre a doçura
Aprendei de mim que sou doce e humilde do coração
1. A doçura é chamada a virtude do Cordeiro, isto é, de Jesus Cristo, que sob este nome quis ser designado: Eis o Cordeiro de Deus2. Enviai, ó Senhor, o Cordeiro dominador da terra3. E foi predito que ele na sua paixão se comportaria como um cordeiro: Permanecerá mudo como um cordeiro diante do tosquiador, e não abrirá a boca4. Sou como um cordeiro cheio de mansidão, que levam a imolar no altar5. Assim a doçura foi a virtude predileta do nosso Salvador. Mostrou ele quanto era doce, beneficiando os ingratos, respondendo com bondade aos seus contraditores, e suportando sem se queixar os que o injuriavam e maltratavam:Quando o maldiziam, não amaldiçoava; quando o maltratavam, não fazia ameaças6. Tendo sido flagelado, coroado de espinhos, cuspido, pregado na cruz e coberto de opróbrios, tudo esqueceu, e orou pelos que o tinham tratado tão indignamente. É propondo-nos um tal exemplo que nos exorta sobretudo à prática da humildade e da doçura.
De todas as virtudes, diz S. João Crisóstomo, é a doçura que nos torna mais semelhantes a Deus7. Na verdade, é próprio de Deus tornar bem por mal, conforme a palavra do Redentor: Fazei bem aos que vos odeiam... para serdes verdadeiros filhos do vosso Pai que está nos céus, e faz nascer o sol sobre os bons e os maus8. E é o que ainda faz dizer a S. João Crisóstomo — que são apenas os homens doces, que Jesus Cristo apelida imitadores de Deus9.
Aos que são doces é prometido o Paraíso10. “A doçura, diz S. Francisco de Sales, é a flor da caridade”11. E o Eclesiástico declara que um coração doce e fiel faz as delícias do Senhor12. Os que são doces não sabe Deus repeli-los13. Sempre lhe são extremamente agradáveis as orações dos humildes e doces14.
Ora, a virtude da doçura consiste em duas coisas: 1.ª em reprimir os movimentos de cólera contra os que os provocam; 2.ª em suportar os desprezos.
I - É necessário reprimir a cólera
Diz Sto. Ambrósio que a cólera é uma paixão que se deve prevenir ou reprimir15. Quem se sente inclinado a este vício deve ser diligente em fugir às ocasiões; e, se tiver de encontrar-se nelas, deve estar na firme resolução de se calar, ou de responder com doçura, e prevenir-se com a oração, pedindo ao Senhor a força para resistir e conter-se. Alguns, para se desculparem, dizem que tal pessoal é insuportável, que ninguém a satisfaz... A virtude da doçura, observa S. João Crisóstomo, não consiste em usar de doçura com os doces; exige que se seja doce com os que não sabem o que é a doçura16. Em especial, quando o próximo está irritado, não há melhor meio para o acalmar, do que responder-lhe com doçura: Uma resposta doce quebrando a cólera17.
Assim como a água apaga o fogo, assim, diz S. João Crisóstomo, uma resposta doce abranda a cólera dum nosso irmão, por muito exasperado que ele esteja18. Isto está de acordo está de acordo com o dizer do Eclesiástico: A linguagem doce concilia muitos amigos, e pacifica os inimigos19. E o santo Doutor acrescenta: Nem o fogo se apaga com fogo, nem o furor com furor20.Mesmo com os pecadores mais pervertidos, obstinados e insolentes, é necessário que nós, os padres, usemos da máxima doçura possível, para os atrairmos a Deus. Não estais constituídos juízes de crimes, para castigardes, diz Hugo de S. Vitor, mas de enfermos para os curardes21.
Quando nos sentimos agitados por algum impulso de cólera, o único remédio é calarmo-nos e pedir ao Senhor que nos dê força para não respondermos.O melhor remédio para a cólera, diz Sêneca, é esperar22. De fato, se falarmos no fogo da paixão, o que dissermos nos parecerá justo, embora seja de todo o ponto injusto e censurável; porque a paixão é como um véu diante dos olhos; impede-nos de ver o alcance das nossas palavras, conforme o pensamento de S. Bernardo: O olho perturbado pela cólera vê claro23.
Por vezes nos parece justo, necessário até, reprimir a audácia dum insolvente, dum inferior, por exemplo, que nos falta ao respeito. Então, sem dúvida, rigorosamente falando, conviria entrar numa cólera moderada, como ensina o Doutor angélico24, mas seria necessário que isso se fizesse sem pecar, como diz Davi: Irai-vos, mas não pequeis25. Eis a dificuldade. É muito arriscado o estado de cólera: é como que montar um cavalo fogoso, que não obedece ao freio; não se sabe até onde ele nos levará. Por isso mesmo S.Francisco de Sales nos assegura que é sempre conveniente reprimir os movimentos da cólera, por mais justa que nos pareça a causa dela: “Mais vale, acrescenta ele, que digam de vós que nunca vos irais, do que dizerem que vos irais com justiça”26. E, segundo Sto. Agostinho27, desde que se deixa entrar a cólera na alma, com dificuldade se consegue lançá-la fora; por isso nos aconselha que de todo lhe fechemos a porta, logo que ela se apresente. De mais, se o repreendido vir que o seu superior está irado, pouco proveito colherá da correção, olhando-a antes como efeito da cólera que da caridade.Uma repreensão feita com doçura e rosto sereno é mais útil que mil censuras, por justas que sejam, em estado de arrebatamento.
De resto, não exige a virtude da doçura que, para usarmos de indulgência e não desagradarmos ao próximo, deixemos de repreender com severidade, quando é necessário; não seria isso virtude, antes uma falta, uma negligência indesculpável. Ali daquele, diz o profeta que reclina os pecadores em almofadas, para que adormeçam em paz num sono mortal!28 Esta complacência culpável, diz Sto. Agostinho, não é caridade nem doçura, mas negligência29.
Proceder assim é ser cruel para com essas pobres almas, que se perdem à falta de quem as avise da sua desgraça. Ao tempo de ser operado, observa S. Cipriano, queixa-se um doente do cirurgião; mas depois de curado dá-lhe os seus agradecimentos30. Quer pois a doçura que, quando o dever nos obriga a repreender o próximo, o façamos sempre com firmeza, sim, mas também com mansidão. Para chegarmos a este resultado, o Apóstolo nos previne de que, antes de repreendermos os outros, consideremos os nossos próprios defeitos, para concebermos pelo próximo toda a compaixão, que temos para conosco: Meus irmãos, se algum pecar, vós que sois espirituais repreendei-o com espírito de doçura, atendendo a vós mesmos, para não serdes tentados31. No dizer de Paulo de Blois, é uma coisa vergonhosa ver um superior a corrigir com ira e azedume32. Tão vil é a cólera, diz Sêneca, que até os rostos mais belos torna horríveis33.
Necessário é pois que neste ponto nos conformemos sempre com a máxima de S. Gregório: Que o amor nada tenha de mole; que o rigor não vá até exasperar o culpado; que a doçura seja indulgente, mas não ultrapasse os limites da convenitência34.Não devem os médicos, diz S. Basílio, irritar os doentes; o que devem é curar-lhes as doenças35. Conta Cassiano36 que um jovem religioso, assaltado por tentações violentas contra a castidade, foi ter com outro religioso de avançada idade, para que lhe prestasse algum auxílio; mas este, em vez de o ajudar e reanimar, mais o afligiu, fazendo-lhe censuras. Que aconteceu porém?O Senhor permitiu que esse velho de tal modo fosse atormentado pelo espírito impuro, que andasse pelo mosteiro a correr como um louco. O abade Sto. Apolônio, informado do seu procedimento indiscreto, disse-lhe então: “Fica sabendo, irmão meu, que Deus te permitiu esta prova, para que aprendas a ter compaixão dos outros”.
Quando pois virmos as fraquezas e quedas dos outros, longe de os invectivarmos com assomos de vaidade pessoal, devemos ajudá-los quanto possível e humilharmo-nos. De contrário, Deus permitirá que caiamos nas mesmas faltas que lhes censuramos. Sobre este assunto, refere ainda Cassiano que um abade chamado Macheta confessava ter caído miseravelmente em três faltas, que primeiro tinha condenado em seus irmãos. Razão por que Sto. Agostinho ensina que a correção sempre deve ser precedida, não de indignação, mas de compaixão para com o próximo37. E S. Gregório 38 ajunta que a consideração dos nossos próprios defeitos não deixará de nos tornar compassivos e indulgentes com as faltas dos outros.
Nada aproveitamos pois, nem para nós nem para os outros, com a cólera; ou melhor, sempre ela nos prejudica; quando nos não cause outros danos, pelo menos tira-nos a paz. Ao saber que tinha perdido uma parte dos seus bens, o filósofo Agripino contentou-se com dizer: “Se perdi a minha propriedade, não quero perder também a paz”. Como dizia Sêneca39, as injúrias por si mesmo não nos podem causar tamanho mal, como a cólera em que caímos ao recebê-las. Quem se irrita com os ultrajes que o recebe, a si próprio se atormenta, segundo o pensamento de Sto. Agostinho, que assim fala ao Senhor: Vós ordenastes que toda a alma que sai da ordem seja o algoz de si mesma40.
O mestre da doçura, S. Francisco de Sales41, ensina que devemos ser doces não só com os outros, mas conosco próprios. Pessoas há que, tendo cometido alguma falta, se irritam contra si mesmas, caiem na inquietação e depois em mil outras faltas. O demônio, dizia S. Luís de Gonzaga, pesca sempre nas águas turvas. Não devemos perturbar-nos à vista dos nossos defeitos, porque a perturbação nesse caso é efeito do nosso orgulho e da alta idéia que tínhamos da nossa virtude. O que então temos a fazer é humilharmo-nos, e detestar em paz o pecado cometido, recorrendo ao mesmo tempo a Deus, e esperando dele a força para não mais recairmos.Em resumo: os que são verdadeiramente humildes e doces vivem sempre em paz, e sempre conservam a tranqüilidade no coração, aconteça o que acontecer. Foi o que Jesus Cristo42 lhes prometeu: Aprendei de mim que sou doce e humilde do coração e encontrareis a paz para as vossas almas (Matth.11, 29).
E Davi tinha dito: Os que são doces possuirão a terra, e gozarão duma paz deliciosa e profunda43. Assim, S. Leão nos dá esta segurança: Não há injúria, nem perda, nem desgosto, qualquer que seja, que perturbe a paz dum coração, em que reine a doçura44. Se por desgraça nos acontecer cair em estado de cólera, esforcemo-nos então, conforme o conselho de S. Francisco de Sales, por conter os nossos ímpetos, de pronto, sem nos demorarmos a deliberar se convirá ou não fazê-lo. E depois de termos tido qualquer contestação com alguém, não deixemos prolongar a perturbação dela resultante; pratiquemos o ensino do Apóstolo: Que o sol se não ponha sobre o vosso ressentimento; não abrais a porta ao demônio45. Cuidemos primeiro de nos pormos em paz conosco, e reconciliemo-nos depois com a pessoa contra quem nos iramos, para que o demônio não possa com essa centelha acender em nós alguma chama mortal, que nos faça perecer.
II - É necessário suportar os desprezos
A segunda coisa, em que principalmente consiste a doçura, é na paciência em sofrer os desprezos. Dizia S. Francisco de Assis que muitas pessoas fazem consistir a sua perfeição em recitar muitas orações, ou fazer muitas mortificasses corporais, ao passo que não podem suportar uma palavra injuriosa.Não compreendem elas, ajuntava o santo, quanto lhes é mais proveitoso suportar as afrontas46. Maior mérito haverá em receber em paz uma injúria, que em jejuar dez dias a pão e água.
Segundo S. Bernardo, há três graus de virtude a que deve aspirar quem quer santificar-se: o primeiro é não querer dominar sobre os outros; o segundo querer estar sujeito a todos; o terceiro sofrer com paciência as injúrias47.
Vereis, por exemplo, que se concede aos outros o que a vós se recusa; que o que os outros dizem é escutado; e o que vós dizeis escarnecido; que os outros são louvados, escolhidos para empregos honrosos e negócios importantes, e que de vós se não faz caso. Tudo quanto fazeis vos atrai censuras e remoques; então, diz S. Doroteu48, sereis verdadeiramente humildes, se aceitardes em paz todas estas humilhações, e se recomendardes a Deus, como vossos maiores benfeitores, os que assim vos tratam, curando o vosso orgulho, — a mais perigosa moléstia, capaz de vos dar a morte.
Sêde pacientes na humilhação49. Eis o que nessas circunstâncias é necessário fazer: não se irritar nem se queixar, mas receber esses desprezos como justos castigos dos próprios pecados. Maiores humilhações se mereciam, ofendendo a Deus: merecia-se estar sob os pés dos demônios. S. Francisco de Borja, numa viagem, teve de se deitar no mesmo leito com o seu companheiro, o Pe. Bustamanto, que sofria de asma, e levou a noite a tossir e a escarrar; julgava porém que escarrava para o lado da parede, e era sobre o santo que o fazia, e por vezes até sobre o seu rosto. Chegado o dia, ficou muito aflito ao ver que tinha feito, mas S. Francisco disse-lhe tranqüilamente: “Meu padre, não vos aflijais com isso; porque em todo este quarto não havia por certo lugar mais próprio para receber os vossos escarros que o meu rosto”.
Os orgulhosos crêem-se dignos de todas as honras, e as humilhações que recebem fazem-nos exasperar na sua soberba; os humildes, ao contrário, julgam-se dignos de todas as ignomínias, e aproveitam-nas para mais se humilharem. É-se humilde, diz S. Bernardo, quando se demuda a humilhação em humildade50. Nota o Pe. Rodrigues que os orgulhosos, ao serem repreendidos, fazem como o ouriço cacheiro: tornam-se espinhos em todo o exterior, isto é, irritam-se, irrompem em queixas, censuras e murmurações contra os outros. Repreendei porém um homem humilde, e ele se humilhará ainda mais, confessará os seus erros e vos agradecerá sem se perturbar. Perturbar-se uma pessoa ao receber uma correção, é dar sinal de que ainda está sob o jugo do orgulho. Assim, o que em tal caso se sente perturbado, deve humilhar-se mais profundamente diante de Deus, e suplicar-lhe que o liberte do orgulho, que ainda reina no seu coração.
O meu nardo exalou o seu odor51. É o nardo uma pequena planta odorífera, mas que só derrama o seu perfume quando se aperta ou esmaga. Ó! que suave perfume derrama diante de Deus uma alma humilde, quando sofre em paz nas humilhações, folgando de se ver desprezada e maltratada pelos outros! Interrogado o monge Zacarias sobre o que era necessário fazer para adquirir a verdadeira humildade, tomou o seu capuz, lançou-o ao chão, calcou-o aos pés e disse: “Quem se compraz em ser tratado como este farrapo, é verdadeiramente humilde”. Dizia o Pe. Alvarez que o tempo das humilhações é o de sairmos das nossas misérias e fazermos larga colheita de merecimentos. Tanto o Senhor é avaro com os orgulhosos, diz S. Tiago, como liberal com os humildes52.
As palavras lisonjeiras de quem louva, diz Sto. Agostinho, podem curar uma consciência culpada, e as palavras grosseiras de quem insulta não podem ferir uma boa consciência53. Tal era também o pensamento de S. Francisco de Assis, quando dizia: “Só somos de fato o que somos diante de Deus”.Pouco importa pois que os homens nos louvem ou nos censurem, contanto que Deus nos aprove, — e certamente aprova de bom grado os que por seu amor sofrem injúrias.
Os que são doces são queridos de Deus e dos homens. Nada há mais edificante para o próximo, nem mais próprio para ganhar corações para Deus, do que a doçura duma pessoa que, desprezada, escarnecida e injuriada, se não irrita, antes recebe tudo com rosto calmo e sereno. Nada torna os domésticos, diz S. João Crisóstomo, tão amantes do seu senhor, como veremno sempre doce e afável 54. Segundo Sto. Ambrósio, era Moisés mais amado dos hebreus por causa da doçura, que havia mostrado no meio dos ultrajes, do que pelos prodígios que tinha operado55. Quem possui a doçura, diz ainda S. João Crisóstomo, é útil a si próprio e aos outros56. Refere o Pe. Mafei que um religioso da Cia. de Jesus, pregando no Japão, recebeu da parte dum insolente um escarro no rosto; enxugou-o com o lenço e continuou o seu discurso, como se nada lhe tivesse acontecido. Ao ver isto, um dos assistentes converteu-se à Fé: “Uma religião que ensina uma tal humildade, disse ele, não pode deixar de ser verdadeira e divina”. Do mesmo modo, converteu grande número de hereges a doçura de S. Francisco de Sales que, sem se perturbar, sofria todas as afrontas que lhe faziam. A doçura é uma pedra de toque: segundo S. João Crisóstomo ( In. Gen. hom. 34), o meio mais seguro para se conhecer se há virtude numa alma, é ver se ela conserva a doçura nas contrariedades. O Pe. Crasset também conta, na sua História da Igreja do Japão, que, durante a última perseguição, um missionário agostinho, que viajava disfarçado, recebera uma bofetada sem se abalar. Ao verem isso, reconheceram que era cristão e prenderam-no, porque os idólatras julgaram que uma tal virtude só num cristão podia existir.
Ó! como à vista de Jesus desprezado é fácil suportar todos os desprezos!A bem-aventurada Maria da Encarnação, ao contemplar um dia o seu crucifixo, disse às suas religiosas: “É possível, minhas irmãs, que nos recusemos a abraçar os desprezos, vendo Jesus Cristo tão desprezado?” Quando Sto. Inácio Mártir foi levado a Roma para ser lançado as feras, ao ser maltratado pelos soldados, estava cheio de consolação: É agora, dizia ele, que começo a ser discípulo de Jesus Cristo57. Pois! Que sabe fazer um cristão, se não sabe suportar alguma humilhação por amor de Jesus Cristo? Sem dúvida, ser desprezado e injuriado, sem se mostrar magoado e sem responder, é uma coisa muito dura para o nosso orgulho; mas é em nos fazermos violência que está o nosso mérito, como ensina Tomás de Kempis: “Segundo a violência que vos fizerdes assim adiantareis”58. Tinha de costume uma boa religiosa, quando lhe faziam alguma afronta, ir à presença ao SS. Sacramento e dizer: “Senhor, sou demasiado pobre para ter alguma coisa preciosa a oferecer-vos, mas ofereço-vos este pequeno presente que acabo de receber”. Ó! Como Jesus Cristo acolhe com amor uma alma na humilhação! Como se apressa a consolá-la e a enchê-la de graças!
Uma alma verdadeiramente amante de Jesus Cristo sofre os ultrajes, não só com resignação, mas com prazer e alegria. Vêde os santos apóstolos: Retiravam-se da presença do Conselho, cheios de alegria por serem julgados dignos de sofrer desprezos pelo nome de Jesus Cristo59. A segunda parte deste texto, dizia S. José Calasâncio, tem aplicação a um grande número: “São julgados dignos de sofrer pelo nome de Jesus”; mas o mesmo não acontece com a primeira parte: “Iam cheios de alegria”. No entanto, quem se quer santificar deve pelos menos aspirar a esta perfeição. Não é humilde, dizia o mesmo santo, quem não deseja os desprezos60. O venerável Luís du Pont não compreendia a princípio, como pudesse um homem encontrar prazer em se ver desprezado; mas, desde que chegou a maior perfeição, compreendeu muito bem e fez a experiência disso. Foi o que Sto. Inácio de Loyola, descendo do Céu depois da sua morte, veio ensinar a Sta. Maria Madalena de Pazi, dizendo-lhe que a verdadeira humildade consiste em encontrar um prazer contínuo em tudo quanto nos possa levar ao desprezo de nós mesmos.Não gozam tanto os mundanos em serem honrados, como os santos em serem desprezados. Quando o irmão Junípero, franciscano, recebia injúrias, estendia a sua túnica, como para recolher pérolas. S. Francisco Régis, na sua conversação, era por vezes objeto de riso para os seus companheiros, e não só tomava nisso prazer, mas até provocava as zombarias deles.
Um dia apareceu nosso Senhor a S. João da Cruz e disse-lhe: João pede-me o que desejas. E o santo respondeu: Senhor, sofrer e ser desprezado por amor de vós61. Era o mesmo que dizer: Senhor, ao ver que tanto sofrestes e tão desprezado fostes por meu amor, que posso eu pedir-vos senão sofrimentos e desprezos?
Numa palavra, para concluirmos: quem quer ser todo de Deus, e tornar-se semelhante a Jesus Cristo, deve gostar de ser desconhecido e tido por nada. Este grande preceito de S. Boaventura, sem cessar o repetia S. Filipe de Néri aos seus filhos espirituais62. Quer Jesus Cristo que nos julguemos felizes e exultemos de alegria quando por seu amor nos virmos odiados, repelidos e ridicularizados dos homens. Dá-nos a segurança duma recompensa do Céu, proporcionada aos desprezos que tivermos levado com alegria: Bem-aventurados sereis quando os homens vos aborrecerem, repelirem, carregarem de afrontas, e abominarem o vosso nome, por causa do Filho do homem63. — Regozijai-vos nesse dia e exultai de alegria, porque é grande a vossa recompensa no Céu64. Que maior alegria pode ter uma alma, do que ver-se desprezada por amor de Jesus Cristo? Então, diz S. Pedro, obtém ela a maior honra a que pode aspirar, por isso que Deus a trata como tratou o seu próprio Filho: Se fordes injuriados por causa do nome de Jesus Cristo, sereis ditosos, porque então repousarão sobre vós a verdadeira honra, a verdadeira glória e a verdadeira virtude que vem de Deus, assim como o seu Espírito65.
1. A doçura é chamada a virtude do Cordeiro, isto é, de Jesus Cristo, que sob este nome quis ser designado: Eis o Cordeiro de Deus2. Enviai, ó Senhor, o Cordeiro dominador da terra3. E foi predito que ele na sua paixão se comportaria como um cordeiro: Permanecerá mudo como um cordeiro diante do tosquiador, e não abrirá a boca4. Sou como um cordeiro cheio de mansidão, que levam a imolar no altar5. Assim a doçura foi a virtude predileta do nosso Salvador. Mostrou ele quanto era doce, beneficiando os ingratos, respondendo com bondade aos seus contraditores, e suportando sem se queixar os que o injuriavam e maltratavam:Quando o maldiziam, não amaldiçoava; quando o maltratavam, não fazia ameaças6. Tendo sido flagelado, coroado de espinhos, cuspido, pregado na cruz e coberto de opróbrios, tudo esqueceu, e orou pelos que o tinham tratado tão indignamente. É propondo-nos um tal exemplo que nos exorta sobretudo à prática da humildade e da doçura.
De todas as virtudes, diz S. João Crisóstomo, é a doçura que nos torna mais semelhantes a Deus7. Na verdade, é próprio de Deus tornar bem por mal, conforme a palavra do Redentor: Fazei bem aos que vos odeiam... para serdes verdadeiros filhos do vosso Pai que está nos céus, e faz nascer o sol sobre os bons e os maus8. E é o que ainda faz dizer a S. João Crisóstomo — que são apenas os homens doces, que Jesus Cristo apelida imitadores de Deus9.
Aos que são doces é prometido o Paraíso10. “A doçura, diz S. Francisco de Sales, é a flor da caridade”11. E o Eclesiástico declara que um coração doce e fiel faz as delícias do Senhor12. Os que são doces não sabe Deus repeli-los13. Sempre lhe são extremamente agradáveis as orações dos humildes e doces14.
Ora, a virtude da doçura consiste em duas coisas: 1.ª em reprimir os movimentos de cólera contra os que os provocam; 2.ª em suportar os desprezos.
I - É necessário reprimir a cólera
Diz Sto. Ambrósio que a cólera é uma paixão que se deve prevenir ou reprimir15. Quem se sente inclinado a este vício deve ser diligente em fugir às ocasiões; e, se tiver de encontrar-se nelas, deve estar na firme resolução de se calar, ou de responder com doçura, e prevenir-se com a oração, pedindo ao Senhor a força para resistir e conter-se. Alguns, para se desculparem, dizem que tal pessoal é insuportável, que ninguém a satisfaz... A virtude da doçura, observa S. João Crisóstomo, não consiste em usar de doçura com os doces; exige que se seja doce com os que não sabem o que é a doçura16. Em especial, quando o próximo está irritado, não há melhor meio para o acalmar, do que responder-lhe com doçura: Uma resposta doce quebrando a cólera17.
Assim como a água apaga o fogo, assim, diz S. João Crisóstomo, uma resposta doce abranda a cólera dum nosso irmão, por muito exasperado que ele esteja18. Isto está de acordo está de acordo com o dizer do Eclesiástico: A linguagem doce concilia muitos amigos, e pacifica os inimigos19. E o santo Doutor acrescenta: Nem o fogo se apaga com fogo, nem o furor com furor20.Mesmo com os pecadores mais pervertidos, obstinados e insolentes, é necessário que nós, os padres, usemos da máxima doçura possível, para os atrairmos a Deus. Não estais constituídos juízes de crimes, para castigardes, diz Hugo de S. Vitor, mas de enfermos para os curardes21.
Quando nos sentimos agitados por algum impulso de cólera, o único remédio é calarmo-nos e pedir ao Senhor que nos dê força para não respondermos.O melhor remédio para a cólera, diz Sêneca, é esperar22. De fato, se falarmos no fogo da paixão, o que dissermos nos parecerá justo, embora seja de todo o ponto injusto e censurável; porque a paixão é como um véu diante dos olhos; impede-nos de ver o alcance das nossas palavras, conforme o pensamento de S. Bernardo: O olho perturbado pela cólera vê claro23.
Por vezes nos parece justo, necessário até, reprimir a audácia dum insolvente, dum inferior, por exemplo, que nos falta ao respeito. Então, sem dúvida, rigorosamente falando, conviria entrar numa cólera moderada, como ensina o Doutor angélico24, mas seria necessário que isso se fizesse sem pecar, como diz Davi: Irai-vos, mas não pequeis25. Eis a dificuldade. É muito arriscado o estado de cólera: é como que montar um cavalo fogoso, que não obedece ao freio; não se sabe até onde ele nos levará. Por isso mesmo S.Francisco de Sales nos assegura que é sempre conveniente reprimir os movimentos da cólera, por mais justa que nos pareça a causa dela: “Mais vale, acrescenta ele, que digam de vós que nunca vos irais, do que dizerem que vos irais com justiça”26. E, segundo Sto. Agostinho27, desde que se deixa entrar a cólera na alma, com dificuldade se consegue lançá-la fora; por isso nos aconselha que de todo lhe fechemos a porta, logo que ela se apresente. De mais, se o repreendido vir que o seu superior está irado, pouco proveito colherá da correção, olhando-a antes como efeito da cólera que da caridade.Uma repreensão feita com doçura e rosto sereno é mais útil que mil censuras, por justas que sejam, em estado de arrebatamento.
De resto, não exige a virtude da doçura que, para usarmos de indulgência e não desagradarmos ao próximo, deixemos de repreender com severidade, quando é necessário; não seria isso virtude, antes uma falta, uma negligência indesculpável. Ali daquele, diz o profeta que reclina os pecadores em almofadas, para que adormeçam em paz num sono mortal!28 Esta complacência culpável, diz Sto. Agostinho, não é caridade nem doçura, mas negligência29.
Proceder assim é ser cruel para com essas pobres almas, que se perdem à falta de quem as avise da sua desgraça. Ao tempo de ser operado, observa S. Cipriano, queixa-se um doente do cirurgião; mas depois de curado dá-lhe os seus agradecimentos30. Quer pois a doçura que, quando o dever nos obriga a repreender o próximo, o façamos sempre com firmeza, sim, mas também com mansidão. Para chegarmos a este resultado, o Apóstolo nos previne de que, antes de repreendermos os outros, consideremos os nossos próprios defeitos, para concebermos pelo próximo toda a compaixão, que temos para conosco: Meus irmãos, se algum pecar, vós que sois espirituais repreendei-o com espírito de doçura, atendendo a vós mesmos, para não serdes tentados31. No dizer de Paulo de Blois, é uma coisa vergonhosa ver um superior a corrigir com ira e azedume32. Tão vil é a cólera, diz Sêneca, que até os rostos mais belos torna horríveis33.
Necessário é pois que neste ponto nos conformemos sempre com a máxima de S. Gregório: Que o amor nada tenha de mole; que o rigor não vá até exasperar o culpado; que a doçura seja indulgente, mas não ultrapasse os limites da convenitência34.Não devem os médicos, diz S. Basílio, irritar os doentes; o que devem é curar-lhes as doenças35. Conta Cassiano36 que um jovem religioso, assaltado por tentações violentas contra a castidade, foi ter com outro religioso de avançada idade, para que lhe prestasse algum auxílio; mas este, em vez de o ajudar e reanimar, mais o afligiu, fazendo-lhe censuras. Que aconteceu porém?O Senhor permitiu que esse velho de tal modo fosse atormentado pelo espírito impuro, que andasse pelo mosteiro a correr como um louco. O abade Sto. Apolônio, informado do seu procedimento indiscreto, disse-lhe então: “Fica sabendo, irmão meu, que Deus te permitiu esta prova, para que aprendas a ter compaixão dos outros”.
Quando pois virmos as fraquezas e quedas dos outros, longe de os invectivarmos com assomos de vaidade pessoal, devemos ajudá-los quanto possível e humilharmo-nos. De contrário, Deus permitirá que caiamos nas mesmas faltas que lhes censuramos. Sobre este assunto, refere ainda Cassiano que um abade chamado Macheta confessava ter caído miseravelmente em três faltas, que primeiro tinha condenado em seus irmãos. Razão por que Sto. Agostinho ensina que a correção sempre deve ser precedida, não de indignação, mas de compaixão para com o próximo37. E S. Gregório 38 ajunta que a consideração dos nossos próprios defeitos não deixará de nos tornar compassivos e indulgentes com as faltas dos outros.
Nada aproveitamos pois, nem para nós nem para os outros, com a cólera; ou melhor, sempre ela nos prejudica; quando nos não cause outros danos, pelo menos tira-nos a paz. Ao saber que tinha perdido uma parte dos seus bens, o filósofo Agripino contentou-se com dizer: “Se perdi a minha propriedade, não quero perder também a paz”. Como dizia Sêneca39, as injúrias por si mesmo não nos podem causar tamanho mal, como a cólera em que caímos ao recebê-las. Quem se irrita com os ultrajes que o recebe, a si próprio se atormenta, segundo o pensamento de Sto. Agostinho, que assim fala ao Senhor: Vós ordenastes que toda a alma que sai da ordem seja o algoz de si mesma40.
O mestre da doçura, S. Francisco de Sales41, ensina que devemos ser doces não só com os outros, mas conosco próprios. Pessoas há que, tendo cometido alguma falta, se irritam contra si mesmas, caiem na inquietação e depois em mil outras faltas. O demônio, dizia S. Luís de Gonzaga, pesca sempre nas águas turvas. Não devemos perturbar-nos à vista dos nossos defeitos, porque a perturbação nesse caso é efeito do nosso orgulho e da alta idéia que tínhamos da nossa virtude. O que então temos a fazer é humilharmo-nos, e detestar em paz o pecado cometido, recorrendo ao mesmo tempo a Deus, e esperando dele a força para não mais recairmos.Em resumo: os que são verdadeiramente humildes e doces vivem sempre em paz, e sempre conservam a tranqüilidade no coração, aconteça o que acontecer. Foi o que Jesus Cristo42 lhes prometeu: Aprendei de mim que sou doce e humilde do coração e encontrareis a paz para as vossas almas (Matth.11, 29).
E Davi tinha dito: Os que são doces possuirão a terra, e gozarão duma paz deliciosa e profunda43. Assim, S. Leão nos dá esta segurança: Não há injúria, nem perda, nem desgosto, qualquer que seja, que perturbe a paz dum coração, em que reine a doçura44. Se por desgraça nos acontecer cair em estado de cólera, esforcemo-nos então, conforme o conselho de S. Francisco de Sales, por conter os nossos ímpetos, de pronto, sem nos demorarmos a deliberar se convirá ou não fazê-lo. E depois de termos tido qualquer contestação com alguém, não deixemos prolongar a perturbação dela resultante; pratiquemos o ensino do Apóstolo: Que o sol se não ponha sobre o vosso ressentimento; não abrais a porta ao demônio45. Cuidemos primeiro de nos pormos em paz conosco, e reconciliemo-nos depois com a pessoa contra quem nos iramos, para que o demônio não possa com essa centelha acender em nós alguma chama mortal, que nos faça perecer.
II - É necessário suportar os desprezos
A segunda coisa, em que principalmente consiste a doçura, é na paciência em sofrer os desprezos. Dizia S. Francisco de Assis que muitas pessoas fazem consistir a sua perfeição em recitar muitas orações, ou fazer muitas mortificasses corporais, ao passo que não podem suportar uma palavra injuriosa.Não compreendem elas, ajuntava o santo, quanto lhes é mais proveitoso suportar as afrontas46. Maior mérito haverá em receber em paz uma injúria, que em jejuar dez dias a pão e água.
Segundo S. Bernardo, há três graus de virtude a que deve aspirar quem quer santificar-se: o primeiro é não querer dominar sobre os outros; o segundo querer estar sujeito a todos; o terceiro sofrer com paciência as injúrias47.
Vereis, por exemplo, que se concede aos outros o que a vós se recusa; que o que os outros dizem é escutado; e o que vós dizeis escarnecido; que os outros são louvados, escolhidos para empregos honrosos e negócios importantes, e que de vós se não faz caso. Tudo quanto fazeis vos atrai censuras e remoques; então, diz S. Doroteu48, sereis verdadeiramente humildes, se aceitardes em paz todas estas humilhações, e se recomendardes a Deus, como vossos maiores benfeitores, os que assim vos tratam, curando o vosso orgulho, — a mais perigosa moléstia, capaz de vos dar a morte.
Sêde pacientes na humilhação49. Eis o que nessas circunstâncias é necessário fazer: não se irritar nem se queixar, mas receber esses desprezos como justos castigos dos próprios pecados. Maiores humilhações se mereciam, ofendendo a Deus: merecia-se estar sob os pés dos demônios. S. Francisco de Borja, numa viagem, teve de se deitar no mesmo leito com o seu companheiro, o Pe. Bustamanto, que sofria de asma, e levou a noite a tossir e a escarrar; julgava porém que escarrava para o lado da parede, e era sobre o santo que o fazia, e por vezes até sobre o seu rosto. Chegado o dia, ficou muito aflito ao ver que tinha feito, mas S. Francisco disse-lhe tranqüilamente: “Meu padre, não vos aflijais com isso; porque em todo este quarto não havia por certo lugar mais próprio para receber os vossos escarros que o meu rosto”.
Os orgulhosos crêem-se dignos de todas as honras, e as humilhações que recebem fazem-nos exasperar na sua soberba; os humildes, ao contrário, julgam-se dignos de todas as ignomínias, e aproveitam-nas para mais se humilharem. É-se humilde, diz S. Bernardo, quando se demuda a humilhação em humildade50. Nota o Pe. Rodrigues que os orgulhosos, ao serem repreendidos, fazem como o ouriço cacheiro: tornam-se espinhos em todo o exterior, isto é, irritam-se, irrompem em queixas, censuras e murmurações contra os outros. Repreendei porém um homem humilde, e ele se humilhará ainda mais, confessará os seus erros e vos agradecerá sem se perturbar. Perturbar-se uma pessoa ao receber uma correção, é dar sinal de que ainda está sob o jugo do orgulho. Assim, o que em tal caso se sente perturbado, deve humilhar-se mais profundamente diante de Deus, e suplicar-lhe que o liberte do orgulho, que ainda reina no seu coração.
O meu nardo exalou o seu odor51. É o nardo uma pequena planta odorífera, mas que só derrama o seu perfume quando se aperta ou esmaga. Ó! que suave perfume derrama diante de Deus uma alma humilde, quando sofre em paz nas humilhações, folgando de se ver desprezada e maltratada pelos outros! Interrogado o monge Zacarias sobre o que era necessário fazer para adquirir a verdadeira humildade, tomou o seu capuz, lançou-o ao chão, calcou-o aos pés e disse: “Quem se compraz em ser tratado como este farrapo, é verdadeiramente humilde”. Dizia o Pe. Alvarez que o tempo das humilhações é o de sairmos das nossas misérias e fazermos larga colheita de merecimentos. Tanto o Senhor é avaro com os orgulhosos, diz S. Tiago, como liberal com os humildes52.
As palavras lisonjeiras de quem louva, diz Sto. Agostinho, podem curar uma consciência culpada, e as palavras grosseiras de quem insulta não podem ferir uma boa consciência53. Tal era também o pensamento de S. Francisco de Assis, quando dizia: “Só somos de fato o que somos diante de Deus”.Pouco importa pois que os homens nos louvem ou nos censurem, contanto que Deus nos aprove, — e certamente aprova de bom grado os que por seu amor sofrem injúrias.
Os que são doces são queridos de Deus e dos homens. Nada há mais edificante para o próximo, nem mais próprio para ganhar corações para Deus, do que a doçura duma pessoa que, desprezada, escarnecida e injuriada, se não irrita, antes recebe tudo com rosto calmo e sereno. Nada torna os domésticos, diz S. João Crisóstomo, tão amantes do seu senhor, como veremno sempre doce e afável 54. Segundo Sto. Ambrósio, era Moisés mais amado dos hebreus por causa da doçura, que havia mostrado no meio dos ultrajes, do que pelos prodígios que tinha operado55. Quem possui a doçura, diz ainda S. João Crisóstomo, é útil a si próprio e aos outros56. Refere o Pe. Mafei que um religioso da Cia. de Jesus, pregando no Japão, recebeu da parte dum insolente um escarro no rosto; enxugou-o com o lenço e continuou o seu discurso, como se nada lhe tivesse acontecido. Ao ver isto, um dos assistentes converteu-se à Fé: “Uma religião que ensina uma tal humildade, disse ele, não pode deixar de ser verdadeira e divina”. Do mesmo modo, converteu grande número de hereges a doçura de S. Francisco de Sales que, sem se perturbar, sofria todas as afrontas que lhe faziam. A doçura é uma pedra de toque: segundo S. João Crisóstomo ( In. Gen. hom. 34), o meio mais seguro para se conhecer se há virtude numa alma, é ver se ela conserva a doçura nas contrariedades. O Pe. Crasset também conta, na sua História da Igreja do Japão, que, durante a última perseguição, um missionário agostinho, que viajava disfarçado, recebera uma bofetada sem se abalar. Ao verem isso, reconheceram que era cristão e prenderam-no, porque os idólatras julgaram que uma tal virtude só num cristão podia existir.
Ó! como à vista de Jesus desprezado é fácil suportar todos os desprezos!A bem-aventurada Maria da Encarnação, ao contemplar um dia o seu crucifixo, disse às suas religiosas: “É possível, minhas irmãs, que nos recusemos a abraçar os desprezos, vendo Jesus Cristo tão desprezado?” Quando Sto. Inácio Mártir foi levado a Roma para ser lançado as feras, ao ser maltratado pelos soldados, estava cheio de consolação: É agora, dizia ele, que começo a ser discípulo de Jesus Cristo57. Pois! Que sabe fazer um cristão, se não sabe suportar alguma humilhação por amor de Jesus Cristo? Sem dúvida, ser desprezado e injuriado, sem se mostrar magoado e sem responder, é uma coisa muito dura para o nosso orgulho; mas é em nos fazermos violência que está o nosso mérito, como ensina Tomás de Kempis: “Segundo a violência que vos fizerdes assim adiantareis”58. Tinha de costume uma boa religiosa, quando lhe faziam alguma afronta, ir à presença ao SS. Sacramento e dizer: “Senhor, sou demasiado pobre para ter alguma coisa preciosa a oferecer-vos, mas ofereço-vos este pequeno presente que acabo de receber”. Ó! Como Jesus Cristo acolhe com amor uma alma na humilhação! Como se apressa a consolá-la e a enchê-la de graças!
Uma alma verdadeiramente amante de Jesus Cristo sofre os ultrajes, não só com resignação, mas com prazer e alegria. Vêde os santos apóstolos: Retiravam-se da presença do Conselho, cheios de alegria por serem julgados dignos de sofrer desprezos pelo nome de Jesus Cristo59. A segunda parte deste texto, dizia S. José Calasâncio, tem aplicação a um grande número: “São julgados dignos de sofrer pelo nome de Jesus”; mas o mesmo não acontece com a primeira parte: “Iam cheios de alegria”. No entanto, quem se quer santificar deve pelos menos aspirar a esta perfeição. Não é humilde, dizia o mesmo santo, quem não deseja os desprezos60. O venerável Luís du Pont não compreendia a princípio, como pudesse um homem encontrar prazer em se ver desprezado; mas, desde que chegou a maior perfeição, compreendeu muito bem e fez a experiência disso. Foi o que Sto. Inácio de Loyola, descendo do Céu depois da sua morte, veio ensinar a Sta. Maria Madalena de Pazi, dizendo-lhe que a verdadeira humildade consiste em encontrar um prazer contínuo em tudo quanto nos possa levar ao desprezo de nós mesmos.Não gozam tanto os mundanos em serem honrados, como os santos em serem desprezados. Quando o irmão Junípero, franciscano, recebia injúrias, estendia a sua túnica, como para recolher pérolas. S. Francisco Régis, na sua conversação, era por vezes objeto de riso para os seus companheiros, e não só tomava nisso prazer, mas até provocava as zombarias deles.
Um dia apareceu nosso Senhor a S. João da Cruz e disse-lhe: João pede-me o que desejas. E o santo respondeu: Senhor, sofrer e ser desprezado por amor de vós61. Era o mesmo que dizer: Senhor, ao ver que tanto sofrestes e tão desprezado fostes por meu amor, que posso eu pedir-vos senão sofrimentos e desprezos?
Numa palavra, para concluirmos: quem quer ser todo de Deus, e tornar-se semelhante a Jesus Cristo, deve gostar de ser desconhecido e tido por nada. Este grande preceito de S. Boaventura, sem cessar o repetia S. Filipe de Néri aos seus filhos espirituais62. Quer Jesus Cristo que nos julguemos felizes e exultemos de alegria quando por seu amor nos virmos odiados, repelidos e ridicularizados dos homens. Dá-nos a segurança duma recompensa do Céu, proporcionada aos desprezos que tivermos levado com alegria: Bem-aventurados sereis quando os homens vos aborrecerem, repelirem, carregarem de afrontas, e abominarem o vosso nome, por causa do Filho do homem63. — Regozijai-vos nesse dia e exultai de alegria, porque é grande a vossa recompensa no Céu64. Que maior alegria pode ter uma alma, do que ver-se desprezada por amor de Jesus Cristo? Então, diz S. Pedro, obtém ela a maior honra a que pode aspirar, por isso que Deus a trata como tratou o seu próprio Filho: Se fordes injuriados por causa do nome de Jesus Cristo, sereis ditosos, porque então repousarão sobre vós a verdadeira honra, a verdadeira glória e a verdadeira virtude que vem de Deus, assim como o seu Espírito65.
Notas:
1. Discite a me quia mitis sum et humilis corde (Matth. 11, 29)
2. Ecce Agnus Dei (Jo. 1, 29).
3. Emitte Agnum, Domine, dominatorem terrae (Is. 16, 1).
4. Quasi agnus coram tondente se, obmutescet, et non aperiet os suum (Is. 53, 7).
5. Quasi agnus mansuetus qui portatur ad victimam (Jer. 11, 19).
6. Qui, cum malediceretur, non maledicebat; cum pateretur non comminabatur (1. Pet. 2, 23).
7. Mansuetudo prae caeteris virtutibus nos Deo conformes facit (In Rom. hom. 19).
8. Benefacite his qui oderunt vos... ut sitis filii Patris vestri qui in coelis est, qui solem oriri facit super bonos et malos (Matth. 5, 44).
9. Eos solos qui mansuetudine conspicui sunt, Dei imitatores Christus nominat (Serm. de Mansuetudine).
10. Beati mites, quoniam ipsi possidebunt terram (Matth. 5, 4).
11. Introd. p. 3. ch. 8.
12. Quod beneplacitum est illi, fides et mansuetudo (Eccli. 1, 34).
13. Suscipiens mansuetos Dominus (Ps. 146, 6).
14. Humilium et mansuetorum semper tibi placuit deprecatio (Judith, 9, 16).
15. Caveatur iracundia, aut cohibeatur (Offic. l. 1. c. 21).
16. Cum his qui sunt a mansuetudine alienissimi, tunc virtus ostenditur (In Ps. 119).
17. Responsio mollis frangit iram (Prov. 15, 1).
18. Sicut rogum accensum aqua exstinguit, ita animam ira aestuantem verbum cum mansuetudine prolatum mitigat (In Gen. hom. 58).
19. Verbum dulce multiplicat amicos, et mitigat inimicos (Eccli. 6, 5).
20. Igne non potest ignis extingui, nec furor furore.
21. Vos non, quasi judices criminum, ad percutiendum positi estis, sed, quasi judices morborum, ad sanandum (Misc. l. 1. tit. 49).
22. Maximum remedium est irae, mora (De Ira, l. 2. c. 28).
23. Turbatus prae ira oculus rectum non videt (De Consid. l. 2. c. 11).
24. Secundum rectam rationem irasci (2. 2. q. 158. a. 1).
25. Irascimini et nolite peccare (Ps. 4. 5).
26. Introd. p. 3. chap. 8.
27. Epist. 38. E. B.
28. Vae, quae consuunt pulvillos sub omni cubito manus, et faciunt cervicalia sub capite universae aetatis, ad capiendas animas...! Et confortastis manus impii, ut non reverteretur a via sua mala, et viveret (Ezechi. 13, 18).
29. Non est ista charitas, sed languor (In 1. Jo. tr. 7).
30. Licet conqueratur aeger impatiens per dolorem, gratias aget postmodum, cum senserit sanitatem (De Lapsis).
31. Fratres, et si praeoccupatus fuerit homo in aliquo delicto, vos qui spirituales estis, hujusmodi instruite in spiritu lenitatis, considerans teipsum, ne et tu tenteris (Gal. 6, 1).
32. Turpe quidem est in praelato, cum ira et austeritate corripere (Epist. 100).
33. Facies turbatior, pulcherrima ora foedavit (De Ira, l. 2. c. 35).
34. Sit amor, sed non emolliens; sit rigor, sed non exansperans; sit pietas, sed non plus quam expediat, parcens (Mor. l. 20. c. 6).
35. Reg. fus. disp. int. 51.
36. Collat. 2. c. 13.
37. Reprehensionem, non odium, sed misericordia praecedat (De Serm. D. in monte l. 2. c.19).
38. Considerata infirmitas propria, mala nobis excusat aliena (Mor. l. 5. c. 33).
39. Plus mihi nocitura est ira, quam injuria (De Ira, l. 3. c. 25).
40. Iussisti ut poena sua sibi sit omnis inordinatus animus (Conf. l. 1. c. 12).
41. Introd. p. 3. ch. 9.
42. Discite a me quia mitis sum et humilis corde, et invenietis requiem animabus vestris.
43. Mansueti autem hereditabunt terram, et delectabuntur in multitudine pacis (Ps. 36, 11).
44. Nihil asperum mitibus (De Epiph. s. 5).
45. Sol non occidat super iracundiam vestram; nolite locum dare diabolo (Ephes. 4, 26).
46. Non intelligentes, quanto majus sit lucrum in tolerantia injuriarum.
47. Primus profectus, nolle dominare; secundas, velle subjici; tertius, injurias aequanimiter pati (De Divers. s. 60).
48. Doctr. 20.
49. In humilitate tua, patientiam habe (Eccli. 2, 4).
50. Est humilis qui humiliationem convertit in humilitatem (In Cant. s. 34).
51. Nardus mea dedit odorem suum (Cant. 1, 11).
52. Deus superbis resistit; humilibus autem dat gratiam (Jac. 11, 6).
53. Nec malam conscientiam sanat laudantis praeconium, nec bonam vulnerat conviciantis opprobrium (Contra Petit. l. 3. c. 7).
54. Nihil ita conciliat domino familiares, ut quod illum vident mansuetudine jucundum (S. de Mansuet.).
55. Ut plus eum pro mansuetudine diligerent, quam pro factis admirarentur (Offic. l. 2. c. 7).
56. Mansuetus utilis sibi et aliis (In Act. hom. 6).
57. Nunc incipio esse Christi discipulus (Ep. ad. Rom.).
58. Tantum proficies, quantum tibi ipsi vim intuleris (De Imit. l. 1 c. 25).
59. Ibant gaudentes a conspectu concilii, quoniam digni habiti sunt pro nomine Jesu contumeliam pati (Act. 5, 41).
60. Non est humilis qui non optat sperni.
61. Joannes, pete quid vis a me. — Domine, pati et contemni pro te.
62. Ama nesciri et pro nihilo reputari (Alpab. rel.).
63. Beati eritis, cum vos oderint homines, et cum separaverint vos, et exprobaverint, et ejecerint nomen vestrum tamquam malum, propter Filium hominis.
64. Gaudete in illa die, et exsultate; ecce enim merces vestra multa est in coelo (Luc. 6, 22).
65. Si exprobramini in nomine Christi, beati eritis, quoniam quod est honoris, gloriae, et virtutis Dei, et qui est ejus Spiritus, super vos requiescit (1. Pet. 4, 14).
2. Ecce Agnus Dei (Jo. 1, 29).
3. Emitte Agnum, Domine, dominatorem terrae (Is. 16, 1).
4. Quasi agnus coram tondente se, obmutescet, et non aperiet os suum (Is. 53, 7).
5. Quasi agnus mansuetus qui portatur ad victimam (Jer. 11, 19).
6. Qui, cum malediceretur, non maledicebat; cum pateretur non comminabatur (1. Pet. 2, 23).
7. Mansuetudo prae caeteris virtutibus nos Deo conformes facit (In Rom. hom. 19).
8. Benefacite his qui oderunt vos... ut sitis filii Patris vestri qui in coelis est, qui solem oriri facit super bonos et malos (Matth. 5, 44).
9. Eos solos qui mansuetudine conspicui sunt, Dei imitatores Christus nominat (Serm. de Mansuetudine).
10. Beati mites, quoniam ipsi possidebunt terram (Matth. 5, 4).
11. Introd. p. 3. ch. 8.
12. Quod beneplacitum est illi, fides et mansuetudo (Eccli. 1, 34).
13. Suscipiens mansuetos Dominus (Ps. 146, 6).
14. Humilium et mansuetorum semper tibi placuit deprecatio (Judith, 9, 16).
15. Caveatur iracundia, aut cohibeatur (Offic. l. 1. c. 21).
16. Cum his qui sunt a mansuetudine alienissimi, tunc virtus ostenditur (In Ps. 119).
17. Responsio mollis frangit iram (Prov. 15, 1).
18. Sicut rogum accensum aqua exstinguit, ita animam ira aestuantem verbum cum mansuetudine prolatum mitigat (In Gen. hom. 58).
19. Verbum dulce multiplicat amicos, et mitigat inimicos (Eccli. 6, 5).
20. Igne non potest ignis extingui, nec furor furore.
21. Vos non, quasi judices criminum, ad percutiendum positi estis, sed, quasi judices morborum, ad sanandum (Misc. l. 1. tit. 49).
22. Maximum remedium est irae, mora (De Ira, l. 2. c. 28).
23. Turbatus prae ira oculus rectum non videt (De Consid. l. 2. c. 11).
24. Secundum rectam rationem irasci (2. 2. q. 158. a. 1).
25. Irascimini et nolite peccare (Ps. 4. 5).
26. Introd. p. 3. chap. 8.
27. Epist. 38. E. B.
28. Vae, quae consuunt pulvillos sub omni cubito manus, et faciunt cervicalia sub capite universae aetatis, ad capiendas animas...! Et confortastis manus impii, ut non reverteretur a via sua mala, et viveret (Ezechi. 13, 18).
29. Non est ista charitas, sed languor (In 1. Jo. tr. 7).
30. Licet conqueratur aeger impatiens per dolorem, gratias aget postmodum, cum senserit sanitatem (De Lapsis).
31. Fratres, et si praeoccupatus fuerit homo in aliquo delicto, vos qui spirituales estis, hujusmodi instruite in spiritu lenitatis, considerans teipsum, ne et tu tenteris (Gal. 6, 1).
32. Turpe quidem est in praelato, cum ira et austeritate corripere (Epist. 100).
33. Facies turbatior, pulcherrima ora foedavit (De Ira, l. 2. c. 35).
34. Sit amor, sed non emolliens; sit rigor, sed non exansperans; sit pietas, sed non plus quam expediat, parcens (Mor. l. 20. c. 6).
35. Reg. fus. disp. int. 51.
36. Collat. 2. c. 13.
37. Reprehensionem, non odium, sed misericordia praecedat (De Serm. D. in monte l. 2. c.19).
38. Considerata infirmitas propria, mala nobis excusat aliena (Mor. l. 5. c. 33).
39. Plus mihi nocitura est ira, quam injuria (De Ira, l. 3. c. 25).
40. Iussisti ut poena sua sibi sit omnis inordinatus animus (Conf. l. 1. c. 12).
41. Introd. p. 3. ch. 9.
42. Discite a me quia mitis sum et humilis corde, et invenietis requiem animabus vestris.
43. Mansueti autem hereditabunt terram, et delectabuntur in multitudine pacis (Ps. 36, 11).
44. Nihil asperum mitibus (De Epiph. s. 5).
45. Sol non occidat super iracundiam vestram; nolite locum dare diabolo (Ephes. 4, 26).
46. Non intelligentes, quanto majus sit lucrum in tolerantia injuriarum.
47. Primus profectus, nolle dominare; secundas, velle subjici; tertius, injurias aequanimiter pati (De Divers. s. 60).
48. Doctr. 20.
49. In humilitate tua, patientiam habe (Eccli. 2, 4).
50. Est humilis qui humiliationem convertit in humilitatem (In Cant. s. 34).
51. Nardus mea dedit odorem suum (Cant. 1, 11).
52. Deus superbis resistit; humilibus autem dat gratiam (Jac. 11, 6).
53. Nec malam conscientiam sanat laudantis praeconium, nec bonam vulnerat conviciantis opprobrium (Contra Petit. l. 3. c. 7).
54. Nihil ita conciliat domino familiares, ut quod illum vident mansuetudine jucundum (S. de Mansuet.).
55. Ut plus eum pro mansuetudine diligerent, quam pro factis admirarentur (Offic. l. 2. c. 7).
56. Mansuetus utilis sibi et aliis (In Act. hom. 6).
57. Nunc incipio esse Christi discipulus (Ep. ad. Rom.).
58. Tantum proficies, quantum tibi ipsi vim intuleris (De Imit. l. 1 c. 25).
59. Ibant gaudentes a conspectu concilii, quoniam digni habiti sunt pro nomine Jesu contumeliam pati (Act. 5, 41).
60. Non est humilis qui non optat sperni.
61. Joannes, pete quid vis a me. — Domine, pati et contemni pro te.
62. Ama nesciri et pro nihilo reputari (Alpab. rel.).
63. Beati eritis, cum vos oderint homines, et cum separaverint vos, et exprobaverint, et ejecerint nomen vestrum tamquam malum, propter Filium hominis.
64. Gaudete in illa die, et exsultate; ecce enim merces vestra multa est in coelo (Luc. 6, 22).
65. Si exprobramini in nomine Christi, beati eritis, quoniam quod est honoris, gloriae, et virtutis Dei, et qui est ejus Spiritus, super vos requiescit (1. Pet. 4, 14).
CONTINUA...
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