Removendo o Impedimento Vaticano II
Christopher
A. Ferrara
(www.remnantnewspaper.com)
Depois da publicação do Novus Ordo Missae,
em 1970, os burocratas do Vaticano, sob o comando de Aníbal Bugnini, mentor da
catastrófica “reforma litúrgica”, promoveram assiduamente a fraude de que a tradicional
Missa em latim tinha sido proibida: derrogada, ab-rogada, objurgada, expurgada,
extirpada, reprovada, encarcerada. Seja o que for. Em resposta à lunática contenda
de que o recebido e aprovado Rito Romano era agora ilegal, muitos católicos
prontamente afluíram para capelas independentes ou para as capelas da Fraternidade
Sacerdotal São Pio X para aguardar o dia em que o Vaticano retomasse o juízo.
Demorou quase 40 anos para que isso acontecesse
definitivamente. Finalmente, em 7-7-07, o Papa Bento XVI declarou abertamente à
Igreja universal, pela primeira vez desde que começou o naufrágio litúrgico, o
que nós tradicionalistas sempre soubemos sobre o Missal em nossas mãos: “este
Missal nunca foi juridicamente revogado e, consequentemente, em princípio,
sempre foi permitido”.
Quanto a Bugnini, levou bem menos do que 40 anos para o
Vaticano recuperar o juízo a respeito dele e de seu “trabalho”, mesmo que os
resultados desastrosos tenham permanecido intactos. Em 1975, depois de alguns
dias lendo um dossiê sobre Bugnini que tinha caído em sua mesa, o Papa Paulo VI
demitiu o Mestre do Desastre, dissolvendo sua congregação e despachando-o para
o Irã, para servir como núncio papal. Como Bugnini admite, falando de si mesmo
na terceira pessoa, o dossiê teria supostamente “provado que o Arcebispo
Bugnini era franco-maçom”. (Bugnini, A
Reforma da Liturgia, 91). Seja o que for que o dossiê provou, o próprio Bugnini
notou a ligação causal para o histórico registro: o Papa leu um dossiê sobre
Bugnini e, então, Bugnini foi demitido. Como Bugnini ainda admitiu, a morte
repentina de sua carreira como o Grande Reformador não poderia ter sido “o produto
de ordinária vida administrativa. Ali, deve
ter havido algo mais abalador” (Ibid.).
Década após década, os promotores da correição pós-conciliar
— vocês sabem quem vocês são — piamente nos asseguraram que “a obediência ao
Papa” nos obrigava a acreditar e agir como se o Papa tivesse proibido a Missa
Tradicional. Agora, o próprio Papa declarou que isso é um absurdo. Mas outra
proposição absurda da correição pós-conciliar permanece em voga: que a Fraternidade
de São Pio X não tem “plena comunhão” com a Igreja, embora seus bispos não sejam
mais considerados excomungados.
Aqui a justiça exige-me que lembre que foi também o Papa
Bento XVI quem afirmou (embora de passagem) que sua intenção ao levantar as
excomunhões dos quatro bispos da FSSPX “foi tirar um impedimento que poderia
dificultar a abertura de uma porta ao diálogo e, portanto, convidar os quatro
bispos e a Fraternidade Sacerdotal São Pio X a redescobrir o caminho para a plena comunhão com a Igreja”.
Assim, o próprio Papa usou a frase. Mas o que isso
significa? Considere a linguagem do decreto de levantamento das excomunhões,
emitido pelo Cardeal Re, da Congregação para os Bispos, pela autoridade do Papa
Bento XVI, em 21 de janeiro de 2009:
Com base nas faculdades expressamente concedidas a mim pelo Santo Padre Bento XVI, em virtude do presente Decreto, retiro dos Bispos Bernard Fellay, Bernard Tissier de Mallerais, Richard Williamson e Alfonso de Galarreta a censura de excomunhão declarada por esta Congregação em 1º de julho de 1988, enquanto declaro privado de efeitos jurídicos, a partir do dia de hoje, o Decreto emanado naquele tempo.
Privado de efeitos jurídicos! E quais são os “efeitos
jurídicos” da excomunhão agora considerados nulos? De acordo com o Código de
Direito Canônico de 1983:
Can. 1331, § 1. Uma pessoa excomungada é proibida:
1°- ter qualquer participação
ministerial na celebração do sacrifício da Eucaristia ou em quaisquer
outras cerimônias de culto;
2°- celebrar sacramentos
ou sacramentais e receber os
sacramentos;
3°- exercer quaisquer
ofícios, ministérios ou encargos eclesiásticos ou praticar atos de regime;
Assim, os efeitos da excomunhão são essencialmente três: (1)
proibido de administrar sacramentos, (2) proibido de receber sacramentos, (3)
proibido de exercer qualquer ofício ou ministério na Igreja. A partir disso, segue-se
que o levantamento da excomunhão dos quatro bispos da Fraternidade deveria
significar — se as palavras têm significado — que os quatro bispos agora são
capazes de administrar e receber os sacramentos e exercer ofícios e ministérios
na Igreja, assim
como os padres
da Fraternidade, que nunca foram excomungados em primeiro lugar.
Então, qual é o problema? Aqui é preciso ler com muito
cuidado uma passagem-chave na Carta
do Papa aos bispos do mundo, sobre a remissão das excomunhões:
O fato de a Fraternidade São Pio
X não possuir uma posição canónica na Igreja não se baseia, ao fim e ao cabo,
em razões disciplinares, mas doutrinais. Enquanto a Fraternidade não tiver uma
posição canónica na Igreja, também os seus ministros não exercem ministérios
legítimos na Igreja. Por conseguinte, é necessário distinguir o nível
disciplinar, que diz respeito às pessoas enquanto tais, do nível doutrinal em
que estão em questão o ministério e a instituição. Especificando uma vez mais:
enquanto as questões relativas à doutrina não forem esclarecidas, a Fraternidade
não possui qualquer estado canónico na Igreja, e os seus ministros — embora
tenham sido libertos da punição eclesiástica — não exercem de modo legítimo
qualquer ministério na Igreja.[1]
Surpreendentemente, o Papa está dizendo, aqui, que o único impedimento para o status canônico
da Fraternidade é doutrinário, e que
o hipotético impedimento doutrinário envolve, não heresia ou discordância da
doutrina abaixo do nível do dogma definido, mas questões que precisam ser esclarecidas.
A declaração também especifica, bastante solenemente, que, como indivíduos, os sacerdotes e bispos da
Fraternidade não estão mais sob nenhuma pena canônica que os impeça de exercer
o seu ministério como padres e bispos. O único impedimento é um não especificado esclarecimento de não especificadas questões doutrinárias.
Devo
confessar que eu
não tenho idéia, a partir da leitura desta declaração, do que exatamente a Fraternidade deve fazer para alcançar a “plena comunhão” e, assim, obter “status canônico” e a capacidade de “exercer qualquer ministério” na Igreja. Se,
como indivíduos, os clérigos da Fraternidade não estão mais sob qualquer incapacidade
canônica como tal, qual é a base para um impedimento coletivo da Fraternidade
que consista em questões doutrinais que precisam ser esclarecidas? Nenhuma
parece evidente. É evidente por si mesmo que a Igreja hoje está cheia de
clérigos e leigos cuja doutrina tem urgente necessidade de esclarecimento sobre os pontos fundamentais da fé e da moral, tais como a contracepção. Ainda
não há pronunciamentos do Vaticano sobre a incapacidade dessas pessoas para
administrar ou receber os sacramentos, exercer um ministério, ou até mesmo
conduzir missões canônicas na Igreja, a menos que sua doutrina seja
esclarecida.
É justo perguntar: Será que este impedimento da necessidade de esclarecimento de questões doutrinárias — o que significa, é claro, questões sobre o Vaticano II, e nada mais — foi erigido ad hoc para
a Sociedade e
só a
Sociedade? Não seria o próprio impedimento que necessita de esclarecimento?
Em particular, que proposições a Fraternidade precisa afirmar a fim de superar
o nebuloso impedimento da necessidade de esclarecimento doutrinário? Não estaríamos
lidando com, literalmente, o Impedimento Vaticano
II, seja lá o que isso possa significar? E essa é a pergunta final: Há algum
significado real afinal?
Acabamos de receber uma indicação de que a resposta é
negativa. O blog Rorate
Caeli relatou que, em 28 de maio de 2011, Padre Daniel Couture (a quem
tive o privilégio de assistir durante uma peregrinação no Japão), Superior do
Distrito da Ásia da Fraternidade, foi delegado pelo bispo Fellay para aceitar
os votos de Madre Maria Micaela que foi transferida da Congregação das Irmãs
Dominicanas da Nova Zelândia, uma congregação Novus Ordo, para a das Irmãs
Dominicanas de Wanganui, erigida por Dom Fellay. O relatório observa que Madre Maria
“tinha uma permissão especial da
Congregação para os Institutos Religiosos e Seculares em Roma para fazer isso”[2].
Obviamente, a aprovação desta transferência reconhece
implicitamente o ministério de Dom Fellay na constituição das Irmãs Dominicanas
de Wanganui; o ministério de Padre Couture em receber os votos da freira Novus Ordo que foi transferida para aquela
ordem; e a missão canônica da Fraternidade, em geral, ao delegar um de seus
sacerdotes, através de um de seus bispos, para admitir uma freira em uma ordem
com a qual a Fraternidade é associada e cujo superior é Dom Fellay.
As conversas doutrinárias entre a Fraternidade e o Vaticano
sobre o esclarecimento de questões doutrinárias sobre o Vaticano II foram
concluídas, estamos lendo relatos de que Dom Fellay e dois assistentes foram
convocados ao Vaticano para uma reunião em 14 de setembro, aniversário da data efetiva
do Summorum Pontificum, com o ostensivo
propósito de entregar a declaração final da Fraternidade sobre as conversações.
O “impedimento Vaticano II” está prestes a ser removido? Será que o disparate
sobre a proibição da missa tradicional será jogado na lata de lixo da mitologia
do Vaticano II? Será que o Vaticano finalmente admitirá que o Concílio nada mudou
e nada exigiu dos Católicos a respeito do que eles devem acreditar e praticar a
fim de estar em “plena comunhão” com a Igreja?
Ao que parece, dado o progresso com as Irmãs de Wanganui,
estas questões podem já ter sido respondidas afirmativamente. É claro que serão respondidas afirmativamente, mais
cedo ou mais tarde, assim como nós sempre soubemos que era apenas uma questão
de tempo antes que o próprio Papa admitisse que a Missa tradicional nunca foi
ab-rogada e sempre foi permitida.
Muitos absurdos têm sido dissipados durante este
pontificado. A polêmica neo-Católica sobre o “cisma” dos tradicionalistas é
agora em frangalhos. Quando a Fraternidade estiver, finalmente, “regularizada” de jure — e já está regularizada de facto, quem está enganando quem? — o
que restará da posição neo-Católica? Exatamente nada. E quando exatamente nada
restar de neo-Catolicismo, quando sua pretensão de ser a superioridade moral e
teológica for definitivamente afastada, então a restauração da Igreja pode prosseguir
por toda parte. Façamos votos que a data de extinção seja por volta de 14 de setembro
de 2011.
Tradução: Pale Ideas
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