Artigo forte, que atrairá a ira de muitos. Mas interessante, porque são palavras de um judeu, e lógico, se pensarmos que os judeus que não se fizeram seguidores de Jesus talvez não tenham entendido o significado da própria “eleição” (povo eleito) como “servidão”, e permaneceram ligados ao ódio por Aquele que, segundo eles, havia causado a ruína do mundo deles. E se explica, também, a tendência judaizante da heresia Neocat(1) e a deriva carismática de parte da Igreja. O livro também mostra a ligação do Protestantismo com as ideologias socialistas, da qual não se exclui a participação dos próprios judeus. Boa leitura. E antes de gritar ao antissemitismo, preste atenção a quem é o autor do livro. Obrigada.
Nota: Em (1), as notas de tradução; em [1], as notas originais.
A ORIGEM JUDAICA DO PROTESTANTISMO
Judaísmo e “heresias cristãs” nos escritos do autor judeu Bernard Lazare
Dos primeiros séculos ao Protestantismo
Texto de Andrea Giacobazzi(2)
Breve introdução
“Com o Protestantismo, o espírito judaico triunfou”
O que se segue não pode ser definido como um artigo — ou um ensaio — sobre as ligações entre as heresias “cristãs” e o Judaísmo. Trata-se, basicamente, de uma coleção de excertos de um único livro: “O Antissemitismo. História e causas”[1] (1894), do sionista Bernard Lazare(3), expoente proeminente da cultura hebraica na virada dos séculos XIX e XX. Esta breve apresentação pode servir ao mesmo tempo como uma parcial recensão (no sentido etimológico de “examinar, valorar”) e como base de reflexão acerca da lúcida análise com a qual, um autor bem distante do Catolicismo Romano, parece convergir sobre determinadas interpretações histórico-teológicas. O tema parece ainda mais interessante se for lido, ao contrário do que faz Lazare, pelo ponto de vista da Igreja que – enquanto “Novus Israel”, “Verus Israel” — tem em sua Doutrina o verdadeiro cumprimento da Lei Mosaica. Na Tradição eclesiástica se encontra a continuação perfeita daquele reto caminho que — já antes da vinda de Cristo — fora desviado, no contexto hebraico, por várias “tradições humanas” e, por fim, pelo espírito das heterodoxias farisaicas, por causa das quais o Messias não foi reconhecido por todos os hebreus[2] (“Ai de vós, escribas e fariseus hipócritas, que fechais o reino dos céus diante dos homens; porque assim vós não entrais nele, nem deixais entrar aqueles que querem entrar”[3]) Facilmente se compreende como o Judaísmo de hoje tenha muito pouco a ver com os Santos Profetas do Antigo Testamento que tantas vezes chamaram de volta à Fé genuína o povo e suas autoridades. Mas voltemos às heresias “cristãs”: o que afirma, então, Lazare sobre esta “corrente hebraica” que parece perseguir e golpear, de seita em seita, o Novo Israel Católico?
Os excertos
Embora de maneira fragmentada e com alguma imprecisão que se encontra no texto, o escritor judeu parte das origens:
“[...] Poder-se-ia escrever a história da corrente hebraica na igreja cristã, história que principiaria com o Ebionismo[4] inicial para chegar ao Protestantismo” (p. 51).
Antes de chegar ao Luteranismo:
“[...] Alguns hereges não eram talvez judaizantes? Os Pasagiani(4) da alta Itália observavam a lei mosaica; a heresia de Orleans(5) era uma heresia judaica; uma seita albigense afirmava que a doutrina dos hebreus era preferível à dos cristãos; os Hussitas(6) eram secundados pelos judeus” (p. 107).
“[...] Para vencer os seguidores da Escolástica(7), os humanistas do império se tornaram teólogos, e para melhor se armarem foram às fontes: aprenderam a língua hebraica, não por uma espécie de amadorismo ou por amor à ciência, como Pico della Mirandola(8) e os italianos, mas para encontrar argumentos contra os adversários. No decorrer daqueles anos que preanunciam a Reforma, o hebreu tornou-se educador e ensinou hebraico aos sábios(9). Ele os iniciou nos mistérios da Cabala; depois de lhes ter aberto as portas da filosofia árabe, armou-os contra o Catolicismo com a extraordinária exegese que os rabinos haviam cultivado e fortalecido(10): aquela exegese da qual saberá servir-se o Protestantismo e, mais tarde, o Racionalismo(11)”. (p. 120)
Finalmente, sobre o Protestantismo propriamente dito:
“[...] A Reforma, tanto na Alemanha quanto na Inglaterra, foi um daqueles momentos em que o Cristianismo se revitalizou às fontes hebraicas. Com o Protestantismo, o espírito judaico triunfou. Em certos aspectos, a Reforma foi um retorno ao antigo Ebionismo do período evangélico. Grande parte das seitas protestantes foram semi-hebraicas: mais tarde, alguns protestantes pregaram doutrinas antitrinitárias: entre outros, Michel Servet(12) e os dois Soncino de Siena(13). Até mesmo na Transilvânia, o Antitrinitarismo(14) havia florescido no século XVI, e Seidelius(15) havia sustentado a excelência do Judaísmo e do Decálogo. Os Evangelhos foram abandonados em favor da Bíblia(16) e do Apocalipse. É bem conhecida a influência que estes dois livros exercitaram sobre os luteranos e os calvinistas, e, sobretudo, sobre os Reformadores e os revolucionários ingleses; uma influência que perdurou até o século XVIII; a ela se devem os Quakers(17), os Metodistas(18), os Pietistas(19) e, sobretudo, os Milenaristas(20), os “Homens da Quinta Monarquia”(21) que, com Venner em Londres, sonhavam com a república e se aliavam aos Niveladores(22) de John Lilburne.”
“[...] Até na Alemanha, o Protestantismo, no início, procurou atrair os judeus, e, por este ponto de vista, é singular a analogia entre Lutero e Maomé, ambos tiraram suas doutrinas de fontes hebraicas, ambos quiseram fazer aprovar os seus novos dogmas daquilo que restava de Israel” (p. 122).
Não obstante as adversidades e os conflitos, o Catolicismo continuava a chamar a si os judeus:
“[...] e é também aos judeus que luteranos e calvinistas se dirigem; de fato, parece que estes últimos teriam ficado plenamente convencidos da justeza de sua causa se os filhos de Jacó tivessem se juntado a eles. Mas os judeus foram sempre o povo obstinado da Escritura, o povo teimoso, rebelde a qualquer imposição, tenaz, fiel com ânimo intrépido ao próprio Deus e à própria Lei.”
“A pregação de Lutero foi vã, e o colérico monge publicou contra os judeus um terrível libelo. [...] Não obstante essas violências, não obstante esses movimentos, não obstante as inúmeras controvérsias que tiveram lugar entre protestantes e judeus, estes últimos, na Alemanha, não foram maltratados” (p. 123).
Convite à leitura
O tema “Protestantismo” se detém, obviamente, em 1894: muito se poderia acrescentar em uma eventual atualização que incluísse o hodierno Neoprotestantismo dos tele-pregadores(23) filo-israelitas estadunidenses.
As ideias aqui reportadas valem como um convite à leitura integral do livro de Lazare, do qual o aspecto tratado nessas linhas é apenas um fragmento. O texto representa uma penetrante descrição – ainda que em diversos pontos caracterizada por repudiáveis tons anticristãos – da polarização da relação “judeus-não judeus” ao longo dos milênios. Escrevendo a obra que o tornou célebre, Lazare, um judeu “secularizado atraído por movimentos anarquistas e socialistas, sustentava que a causa do antissemitismo não deveria ser buscada tanto nos antissemitas, quanto, antes, na própria mentalidade dos judeus”[5]. O mérito de tê-lo traduzido e divulgado no âmbito italófono certamente deve ser reconhecido ao Centro Librario Sodalitium di Verrua Savoia.
Notas originais:
[1] Bernard Lazare, “L’antisemitismo. Storia e Cause”, Centro Librario Sodalitium, Verrua Savoia, 2000.
[2] Cf. A. Giacobazzi, “Lo smarrimento di David”, Rinascita, 17-5-13, pp.12-15.
[3] S. Mt 23,13.
[4] Corrente de cristãos “judaizantes” dos primeiros séculos. Negavam a divindade de Jesus Cristo e, simultaneamente, rejeitavam os escritos de São Paulo, considerando-o como um apóstata.
[5] Da contracapa do mesmo livro.
Notas de tradução:
(1) Neocat, refere-se ao “Caminho Neo-catecumenal”, ou “Neo-catecumenato”, dos heréticos Kiko Argüello e Carmen Hernández, cujos estatutos foram definitivamente aprovados por João Paulo II em 2008.
(2) Biografia: Andrea Giacobazzi.
(3) Bernard Lazare (1865-1917) foi um escritor francês, judeu, anarquista. Foi o primeiro dos defensores de Alfred Dreyfus, no “caso Dreyfus”, dedicando-lhe 3 brochuras. Também escreveu sobre Sionismo, do qual era adepto e amigo de seu fundador Theodor Herzl, apesar das divergências posteriores.
(4) “Passageri”, ou “Pasagiani” e “Pasaginiani”, eram heréticos da região lombarda (norte da Itália), no séc. VII, condenados junto com os Valdenses, no Concílio de Verona (1184), sob o Papa Lúcio III, presente o Imperador Federico. Praticavam a circuncisão (eram chamados “os circuncidados”) e sustentavam a necessidade dos ritos judaicos, menos os sacrifícios. Negavam o mistério da Santíssima Trindade, sendo Cristo uma mera criatura. A intenção do Papa era por freio ao furor dos heréticos e impedir as crueldades que exercitavam contra os eclesiásticos (cf. “Dizionário enciclopetico della teologia, della storia della Chiesa, degli autori che hanno scritto intorno alla Religione, dei Concilii, eresie, ordini religiosi etc.”, Abade Nicola Silvestro Bergier, 1ª edição milanês, Volume IV, Milão, Carlo Turati, 1843, p. 465).
(5) O ano mil constituiu o “despertar da heresia”. Durante toda a Idade Média, o Ocidente não havia experimentado este tipo de perseguição. A heresia orleana, de raízes búlgaras, criada entre outros por certo Estevão, confessor de Constança, toma o nome do Concílio de Orleans (1022), presidido pelo Rei Roberto II da França, o Piedoso, e que condenou inúmeros Cátaros (Maniqueistas), infiltrados na Corte, os quais blasfemavam “de Deus, da Santa Virgem e da Santíssima Trindade, recusavam os Sacramentos, isto é, o Batismo, o Corpo de Cristo, como também o Matrimônio; não comiam carnes que tivessem sangue e gordura, porque impuras”.
(6) O termo “hussita” ou “Igreja hussita” define um movimento reformador e revolucionário que surgiu na Boêmia, no século XV. O nome vem do teólogo boêmio Jan Hus (1372-1452), cujas ideias foram condenadas no Concílio de Constança (1415). O movimento mais tarde se juntou à Reforma Protestante. Hus mantinha uma posição muito próxima à de John Wyclif e os valdenses, opiniões que influenciaram Martinho Lutero. Os hussitas eram divididos em dois grupos: os moderados “utraquistas” e os radicais “taboritas” (da cidade de Tabor no sul da Boêmia).
(7) Escolástica, Escolasticismo ou Filosofia Escolástica é um método ocidental de pensamento crítico e de aprendizagem, com origem nas escolas monásticas cristãs, que concilia a Fé cristã com um sistema de pensamento racional, especialmente o da filosofia grega.
(8) Giovanni Pico della Mirandola (1463-1494) foi um erudito, filósofo neoplatônico e humanista do Renascimento italiano. Além do hebraico, ele estudou também a Cabala e o Talmude.
(9) Vê-se que houve uma doutrinação principalmente daqueles que iriam depois ensinar às massas ou aos governantes. Mesma tática empreendida pelos marxistas que invadiram as universidades para formar aqueles que iriam ensinar nas escolas e nas próprias universidades às futuras gerações.
(10) Fala, aqui, do Talmude, o conjunto de interpretações que os rabinos fizeram da Torá. Para os judeus, vale mais a opinião dos rabinos (Talmude) que as palavras de Deus transmitidas por Moisés (Torá).
(11) Racionalismo é baseado nos princípios da busca da certeza pela demonstração e análise, sustentados pelo conhecimento a priori, que não é inato nem decorre da experiência sensível, mas produzido somente pela razão. Introduzido por René Descartes, Baruch Spinoza e Gottfried Wilhelm Leibniz na filosofia moderna, é a corrente central no pensamento liberal.
(12) Miguel Servet (1511-1553) foi um teólogo, médico e filósofo aragonês; humanista, interessava-se por astronomia, meteorologia, geografia, jurisprudência, matemática, anatomia, estudos bíblicos e medicina. Na teologia, desenvolveu uma “Cristologia não-trinitariana”. Condenado por católicos e protestantes, foi denunciado por João Calvino por considerar “blasfêmias execráveis” os ensinos dele, Servet foi preso em Genebra e queimado na fogueira como herege pelos calvinistas, por ordem do “Conselho de Genebra”.
(13) Fausto e Lélio Socino.
(I) Fausto (1539-1604) foi um teólogo e reformador italiano envolvido na causa antitrinitária. Foi influenciado pelo tio Lélio. Em 1580, fixou residência na Polônia, tornando-se o pensador mais influente da igreja antitrinitária “Irmandade Polonesa” (uma mistura teológica: Arianismo, Socinianismo, Servetismo, e Anabatismo), sem chegar a ser um membro, pois se negara a ser batizado novamente. Seu pensamento teológico foi resumido e guardado pelos Irmãos Poloneses no “Catecismo Racoviano” (1609), considerado a primeira obra teológica sistêmica do Antitrinitarismo. A teologia sociniana é uma das mais próximas dos ensinos do Arianismo no Cristianismo dos primeiros séculos.
(II) O humanista, teólogo e reformador Lélio (1529-1562), de uma família de banqueiros e juristas de Siena, estudou o hebraico, latim, grego e árabe e desenvolveu uma teologia racionalista contra o Dogma da Trindade, que mais tarde daria no movimento do Socinianismo. Em 1547, viajou para a Suíça, França, Holanda e Inglaterra onde se uniu a reformadores como Philipp Melanchthon, Calvino e Heinrich Bullinger.
(14) Antitrinitarismo é um termo que indica a negação da doutrina da Trindade e Unicidade de Deus, que é Dogma de Fé definido pelo 1º Concílio de Niceia (325) e pelo Concílio de Constantinopla (381), contra o Arianismo. Os hereges antitrinitários sustentam não haver base bíblica para o conceito de Trindade, mas que haveria um só Deus Pai, que é Espírito, um Filho que se manifestou em carne (Jesus Cristo) e o Espírito Santo, que é a força de que Deus se serve para operar.
(I) Os primeiros antitrinitários foram os Ebionitas, que rejeitavam a doutrina de São Paulo e possuíam um cânon bíblico diverso do católico; para eles, Cristo era um profeta.
(II) Marcionismo. Marcião de Sinope defendia que há duas deidades: uma do Antigo Testamento e outra do Novo.
(III) O Subordinacionismo concebia a subordinação do Filho ao Pai, e era sustentado por apologistas dos séculos II e III, influenciando pensadores cristãos, desde Orígenes até Ário; foi condenado no 1º Concílio de Niceia (325). Hoje, a heresia subordinacionista é encontrada em grupos não cristãos como as Testemunhas de Jeová, os Cristadelfos e pelos Unitaristas Bíblicos.
(IV) Monarquianismo ou Monarquismo, que se divide em quatro: A) O Sabelianismo (Monoteísmo Modalista, Patripassianismo, Unicismo, Monarquianismo Modal ou simplesmente Modalismo), que considera que Deus seria uma Pessoa que se manifesta e opera em diferentes “modos”, como Pai, Filho e Espírito Santo. Ideia de Sabélio, um padre e teólogo (séc. III), excomungado pelo Papa Calixto I em 220. Era chamado também de Patripassianismo, por subentender que Deus, o Pai, teria sofrido na Cruz. Sabélio foi um discípulo do excomungado Noeto de Esmirna, por isso os Modalistas são chamados nas fontes patrísticas de “Noecianos”. B) O Adocionismo, que entende que Deus é um Ser superior a tudo e completamente indivisível, e que o Filho não foi coeterno com o Pai, mas que foi revestido de Deus (adotado) para os Seus planos. Há duas correntes quanto ao tempo da “adoção”: ou o Batismo ou a Ascensão. Um expoente desta crença foi Teódoto de Bizâncio.
(V) Ário (256-336), presbítero de Alexandria, sustentava que a natureza divina do Filho fosse substancialmente inferior à do Pai, e que houve um tempo em que o Verbo de Deus não existira e que, portanto, tivesse sido criado depois. O Arianismo se difundiu principalmente entre os germânicos.
(VI) Macedonianismo ou Pneumatomachismo (“oposição ao Espírito”) foi uma heresia que surgiu em meados do séc. IV (entre 342 e 360), das ideias do Patriarca de Constantinopla, Macedônio I, que negava a divindade do Espírito Santo, reputando-o um intermediário entre Deus e as criaturas. Chamava o Espírito Santo de criatura do Filho e servente do Pai e do Filho. Seus notórios opositores foram Santo Atanásio de Alexandria, São Basílio o Grande, São Serapião, São Gregório Nazianzeno, São Gregório de Nissa e Santo Ambrósio de Milão. Os seus escritos se perderam, e sua doutrina é conhecida apenas pela refutação dos doutos da Igreja, primeiro em uma série de concílios locais e, finalmente, no 1º Concílio de Constantinopla (381), quando se completou o Credo de Niceia com estas palavras: “E no Espírito Santo, Senhor Vivificador, o qual procede do Pai e do Filho. O qual, com o Pai e o Filho é juntamente adorado e glorificado, e foi quem falou pelos profetas”.
(VII) Anomeanismo (Anomeanos ou Anomoeanos, também conhecidos por Heterusianos, Aecianos — de Aécio de Antioquia, criador da heresia anomeana — ou Eunomeanos — de Eunômio de Cízico) foi uma heresia ariana do séc. IV que não só negava a consubstancialidade de Jesus Cristo, como negava que tivesse a mesma natureza de Deus. Rejeitavam as ideias adotadas por Ário posteriormente para ser readmitido na Igreja. É a forma mais extrema de Arianismo. Os Semiarianos (que negavam a consubstancialidade, mas não a mesma natureza) condenaram os Anomeanos no Concílio de Selêucia, e, por sua vez, foram condenados por eles nos Concílio de Constantinopla e Antioquia. São Basílio Magno foi um dos principais opositores do Anomeanismo e autor de “Contra Eunômio”.
(VIII) Acacianismo (de Acácio de Cesárea) foi outra vertente do Arianismo defendida pelos bispos orientais que assumiram uma posição moderada na “Controvérsia Ariana”, formando uma quarta tendência cristológica: como os Anomoeanos, Homousianos e Homoiosianos, defendiam uma fórmula que definisse o Filho semelhante ao Pai, mas de acordo com as Escrituras. São chamados, atualmente, de “Homeus”.
(IX) Gnosticismo, difundido sobretudo no Egito e Síria, identificava o Espírito Santo com a “mãe” de Jesus, e, portanto, no feminino. Em antigos documentos encontrados em Nag Hammadi, o Espírito Santo seria Sophia (Verdade), uma Aeon (Eon, Éon ou Eão) ou Arconte, uma das entidades emanadas de Deus que se formam no Pleroma (a totalidade dos poderes divinos), a qual se afastou do Pai e, ao tentar se reunir a Ele, por um erro deu origem ao Cosmos. Outra emanação, Javé, justamente porque fruto de um erro, criou no Cosmo um mundo imperfeito, o nosso. Cristo tinha a tarefa de se unir a Sophia para levá-la de volta ao Pai, depois disso os Céus colapsariam, o mundo acabaria e o bem venceria o mal. Pura fantasciência, como se vê.
Na Reforma, temos os seguintes antitrinitários:
(I) Miguel Servet (vide nota 12), modalista condenado ao rogo pelos calvinistas.
(II) Socinianismo ou Socianismo, crenças dos socinianos, seguidores de Fausto e Lélio Socino (vide nota 13), considera que em Deus há uma única Pessoa e que Jesus de Nazaré é um homem. Em 1658, os socinianos se estabeleceram principalmente na Transilvânia, Moravia, Hungria, Alemanha, França, Polônia, Países Baixos, Inglaterra e América do Norte, influenciando os Arminianos, os Menonitas, os Dissenters (Dissidentes ou Não-conformistas, são os que se separaram da Igreja Anglicana: (presbiterianos, congregacionalistas, batistas e metodistas), e os Deístas (filosofia naturalista, racional e liberal. Voltaire foi um deísta) ingleses, os Iluministas alemães (laicistas, deístas, panteístas; entre eles: Frederico, o Grande e Gotthold Ephraim Lessing. Surgiu ao mesmo tempo o Haskalá, ou Iluminismo Judaico, com Moisés Mendelssohn), além de Hugo Grócio (arminianista e ecumenista) e Baruch de Espinoza (judeu banido por chérem da Sinagoga de Amsterdam). Suas crenças, resumidas no “Catecismo Racoviano”, são: 1. A Bíblia é a única autoridade, mas tem que ser interpretada pela razão; 2. Rejeição de mistérios; 3. Unidade, eternidade, onipotência, justiça e sabedoria de Deus; 4. A razão é capaz de compreender Deus para a salvação humana, mas Sua imensidão, onipresença e ser infinito são além da compreensão humana, portanto desnecessários à salvação; 5. Rejeição da doutrina do pecado original; 6. Celebração do Batismo e da Eucaristia como símbolos memorativos, sem serem eficazes meios de graça. No Socianismo confluíram diversas ideias antitrinitárias: de Servet aos Anabatistas, da tradição humanística a Juan de Valdés, até Lorenzo Valla. Os ditames do Socinianismo eram uma aplicação do espírito crítico a fatos religiosos, uma desvalorização da dimensão dogmática. O ideal de um cristianismo racional, pacifista e humanitário baseado na ética.
(III) Arminianismo é uma escola de pensamento soteriológica (doutrina da salvação), baseada nas ideias do holandês Jacó Armínio (1560-1609), e seus seguidores históricos, os Remonstrantes (Irmandade Remonstrante ou Igreja Remonstrante), para quem o Ser Divino seria composto por três Pessoas iguais por natureza, mas diferentes por grau: o Filho e o Espírito Santo derivariam do Pai. Fortemente criticado também pelos calvinistas clássicos (dos quais divergem sobre detalhes das doutrinas da predestinação e da salvação), que o chamam de Semipelagianismo (condenado pelo 2º Concílio de Orange, 529). Nesta corrente, com divergências, estão também Hugo Grócio e John Wesley.
(IV) Adventismo, movimento protestante iniciado no séc. XIX dentro do contexto do “Segundo Grande Reavivamento”, é um subconjunto de seitas, dentre as quais a mais proeminente é a dos Adventistas do Sétimo Dia; um dos expoentes mais notório é o maçom (grão-mestre na Loja Morning Star, n. 27) Guilherme Miller, um fazendeiro, miliciano, líder local da comunidade de Low Hampton, Nova Iorque, que se tornou um pregador batista e profetizou a volta de Jesus Cristo para o ano de 1843 e, depois, 1844 (como sabemos, errou), dando origem aos Mileritas. Após o que ficou conhecido como “O Grande Desapontamento”, o grupo se dispersou em outros menores. As divergências entre essas seitas adventistas, embora tenham muito em comum (hermenêutica escatológica), são: o estado inconsciente dos mortos, o castigo no fim dos tempos dos ímpios, a sua aniquilação com um grande fogo quando os ímpios se levantarão para cercar a Nova Jerusalém, a natureza da imortalidade, as regulações alimentares, a guarda do sábado, a ressurreição dos ímpios, e a divergência sobre se o santuário de “Daniel 8” se refere ao que está no céu e na Terra. Também se dividem em dominicais e sabatistas. A costumeira salada protestante. Entre os notórios adventistas há: Joseph Bates e Ellen G. White.
(15) Martin Seidel ou Seidelius (1610-1620) foi um unitarista sociniano polonês que se uniu ao “Szekler Sabbatarians” (Sabatistas da Transilvânia), um movimento unitário surgido na Transilvânia e Hungria, entre os séc. XVI e XIX, que Fausto Soncini classificava como semi-judaizante. Seidelius rejeitava a doutrina messiânica do Novo Testamento (portanto, era judeu).
(16) Aqui, na acepção apenas dos livros do Antigo Testamento.
(17) Quaker (o nome começou como uma chacota por parte dos anglicanos e significa “tremedores”) ou Quacre, é o nome dado a vários grupos religiosos com origem comum num movimento protestante britânico criado pelo inglês George Fox, em 1652, pretendendo a restauração da fé cristã original, após séculos de apostasia da Igreja Anglicana. Se chamavam de “Santos”, “Filhos da Luz” e “Amigos da Verdade”. A denominação é chamada também de Quakerismo, “Sociedade Religiosa dos Amigos”, ou simplesmente “Sociedade dos Amigos” ou “Amigos”. São conhecidos por rejeitar qualquer organização clerical para viver no recolhimento, no purismo moral e na prática ativa do pacifismo (Prêmio Nobel da Paz de 1947), da solidariedade e da filantropia. Não praticam o Batismo com água, nem a “ceia do Senhor”. Creem que o indivíduo seja batizado “com fogo” (pelo Espírito Santo), falando na consciência. Entre os Quakers notórios: duas feministas, Elizabeth Margaret Chandler e Lucretia Mott; Johns Hopkins, filantropo americano, fundador do Hospital, da Universidade e da Escola de Medicina Johns Hopkins; e Richard Nixon, ex-presidente dos Estados Unidos.
(18) Metodismo, que concorda com o Arminianismo, foi liderado pelos ministros anglicanos John Wesley (1703-1791) e seu irmão Charles Wesley (1707-1788). Possui ao menos onze desdobramentos, entre os quais o Exército da Salvação e o Movimento da Santidade (Holiness Churches).
(19) Pietismo é um movimento oriundo do Luteranismo que valoriza as experiências individuais. Surgiu no final do séc. XVII, e teve seu auge entre 1650-1800, como oposição à negligência da ortodoxia luterana para com a dimensão pessoal da religião, pregando a diminuição na ênfase aos credos e confissões, a fraternidade universal dos crentes e uma abertura à expressão religiosa das emoções. O mentor e pioneiro do movimento, Philip Jacob Spener (1635-1705), influenciou outras figuras como August Hermann Francke, Albrecht Bengel, Paul Anton e Johann Kaspar Schade. O Pietismo também influenciou o surgimento de seitas independentes como o Metodismo, o Movimento de Santidade, o Evangelicalismo, o Pentecostalismo, o Neopentecostalíssimo e grupos carismáticos, além de influenciar a teologia liberal de Friedrich Schleiermacher e a filosofia de Immanuel Kant.
(20) Milenarismo ou Milenialismo designa a doutrina baseada em “Apocalipse 20,1-10”, que anuncia o Segundo Advento de Jesus Cristo para constituir um reino com duração de mil anos. A ideia desse reino milenar tornou-se parte importante da teologia cristã em seus três primeiros séculos. Já no séc. II surgiram seitas cristãs (como a dos Montanistas: por Montano, 156-172, também chamada de Heresia Frígia) pregando o breve retorno do Cristo, e logo se instalou a polêmica acerca da época e da natureza desse reinado. Santo Agostinho refutava os que esperavam um rápido advento do milênio, argumentando que Cristo havia dito que ninguém podia conhecer esse dia e essa hora, nem os Anjos do Céu, nem o Filho, mas apenas o Pai (S. Mt 24,35-37). Eusébio de Cesárea também rejeitava o Milenarismo, e a Igreja tratava os Milenaristas com crescente reserva. Apesar de sua condenação extraoficial, o Milenarismo se manteve vivo nas crenças cristãs, como o atestam os escritos de frei Dolcino de Novara, excomungado e condenado por heresia no séc. XVI, e do jesuíta chileno, Manuel Lacunza y Diaz (cujo livro, “A vinda do Messias em glória e majestade”, está no Index Librorum Prohibitorum), em 1790. As ideias de Lacunza, via Eduardo Irving, influenciaram o Dispensacionalismo (John Nelson Darby, séc. XIX), e os Mileritas (Guilherme Miller).
(21) Os “Fifth Monarchists” ou “Fifth Monarchy Men” foram um movimento milenarista inglês do séc. XVII. Se baseavam no Capítulo VI do Livro de Daniel, que falava das quatro Monarquias que se sucederam no mundo; a quinta seria o Reinado de Cristo por mil anos. Vicejaram principalmente em Londres, mas também em Gales, com Vavasor Powell e Morgan Llwyd. Eram fanáticos radicais e, como em outros movimentos similares da época, eram contrários a uma Igreja nacional (estrutura) e ao dízimo, além de serem contrários à nobreza e às elites comerciais. Com a execução de Carlos I, os milenaristas acharam que poderia ser o início de uma revolução que se estenderia por toda a terra, com a deposição de todos os reis e a derrubada da Igreja Católica (não é o sonho do Comunismo?). John Spittlehouse, no escrito com título bem significativo “Rome Ruin’d by Whitehall” (1650), advertiu a Cúria Romana de que Hugh Peter, com o Exército Novo de Cromwell, viria a falar da Cátedra de Pedro, o que não aconteceu, pois Oliver Cromwell, após algumas vitórias que lhe deram o comando da Nação, passou a persegui-los. Thomas Venner, John Rogers e Anne Trapnel, foram alguns dos que foram encarcerados na Torre. Venner foi decapitado depois de outra tentativa de insurreição.
(22) “Niveladores”, em inglês: “Levellers”, foi um importante partido político inglês sob o comando de John Lilburne, durante o período da Revolução Inglesa, no final da 1ª Guerra Civil (1642–1651) e a Commonwealth (1649–1660). Eram agitadores com forte visão republicana, e seu nome representava a ideia de nivelar as coisas e trazer a paridade (igualdade maçônica). Politicamente, se opunham a Cromwell. Pontos fundamentais eram a tolerância religiosa, a igualdade diante da lei e a expansão do sufrágio, influenciando, através de seus princípios e suas batalhas, numerosas correntes políticas que se afirmaram posteriormente, no restante da Europa, como, por exemplo, o Socialismo.
(23) Televangelismo é o uso da televisão para fazer pregações para atingir um maior número de pessoas. O termo original deriva do inglês “televangelism”, uma siglonimização de “television” e “evangelism” cunhado pela revista Time. Esta prática era mais comum entre os Neo-pentecostais, mas, hoje, outras seitas pseudocristã aderiram a ela, atraindo o interesse também de “católicos” modernistas e até mesmo de muçulmanos. Um dos primeiros pregadores a usar a tecnologia para pregar foi Samuel Parkes Cadman, iniciando em 1923 um programa de rádio. Em 1928, através da National Broadcasting Company (NBC), alcançou a audiência de mais de cinco milhões de pessoas em todos os Estados Unidos. Hoje, os tele-pregadores usam também a internet e suas mídias sociais.
Fontes:
Publicado no dia 29-05-2013 no quotidiano “Rinascita” e reproduzido por https://www.andreacarancini.it/2013/05/lorigine-ebraica-del-protestantesimo-in.
Vide também: http://www.quieuropa.it/lorigine-ebraica-del-protestantesimo-in-bernard-lazare.
Tradução: Giulia d’Amore
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