A história dos pretzels
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Giulia d'Amore
Os pretzels têm origem católica. Este lanche popular foi pensado para o tempo da Quaresma, e a sua criação remonta ao século IV, criado em um dos inúmeros mosteiros do norte da Itália, e que se tornou “típico” em diversos outros países da Europa e nos Estados Unidos.
Durante a Quaresma, sob o Império Romano, os fiéis observavam um jejum[1] muito rigoroso, que proibia o consumo de leite, manteiga, queijo, ovos, natas e carne. Os monges, em particular, se mantinham praticamente a pão e água. E os pães que faziam eram bem simples, só com água, farinha e sal, para se lembrarem que a Quaresma era um tempo de oração e penitência. Como sobravam recortes de massa, para não os desperdiçar, moldavam pãezinhos em formato de braços cruzados, para inspirar as crianças à oração, já que, naquela época, os fiéis rezavam dessa forma, com os braços sobre o peito, e cada mão tocando o ombro oposto. Esse formato acabava formando três buracos, que, segundo alguns, representavam a Santíssima Trindade.
Os primeiros nomes dados aos pãezinhos não eram alemães, como se supõe, mas latinos: os monges os chamavam de “pretiola” (recompensa), ou “brachiola” (do latim “brachium”) ou “bracellus” ou “bracellæ” (pequenos braços), pela posição dos braços cruzados. Dessa palavra latina se chegou ao atual “bretzel” ou “pretzel”. Os primeiros pretzels eram uma recompensa para as crianças que memorizavam versículos bíblicos, orações ou faziam todos os deveres da escola.
Do Norte italiano atravessam os Alpes: primeiro vão para França, depois para a Baviera, onde são aperfeiçoados, chegando essencialmente, já na Idade Média, ao produto como o conhecemos hoje. Foi a simplicidade da receita, tão deliciosa e econômica, que contribuiu para que este pão atravessasse metade da Europa e hoje, com razão, pode ser chamado de produto “típico” alemão, suíço, tirolês do sul, austríaco, alsaciano e romeno, só para permanecer no continente europeu, onde também é possível encontrá-lo na versão doce (com açúcar ou cobertura de chocolate) e até frito. Por ser tão comum, não poderia haver uma receita única, mas podemos tentar traçar um único caminho: todos os pretzels têm o mesmo formato, como de um anel com as duas pontas amarradas, como dois braços a se abraçarem — fazer esse malabarismo com facilidade e rapidez requer anos de prática — e são feitos com ingredientes simples e fáceis de encontrar.
Na Alemanha conquistam a todos: os encontramos até em livros de orações muito antigos; e os alemães os usam como comida auspiciosa, tornando-se um alimento oficial da Páscoa, mesmo passando pela Reforma Imperial e o Cisma Oriental. Atualmente é consumido o ano todo, perdendo sua característica original.
Séculos depois, estes pães foram os inocentes protagonistas de uma história particularmente dramática: em 1510, os otomanos tentaram conquistar Viena, mas, não conseguindo entrar por terra, tentaram um ataque por baixo, cavando um túnel sob a muralha que circunda a cidade. Uma jogada perigosa e arriscada, que acabou sendo um fracasso graças aos pretzels. No século XVI, os pretzels ainda eram um produto monástico, por isso os próprios monges, que trabalhavam nas cozinhas durante a madrugada, perceberam as intenções dos turcos e alertaram as autoridades locais: trabalhando no silêncio da noite, nos subterrâneos das igrejas e sacristias, ouviam todos os progressos do inimigo. Não satisfeitos com a “espionagem”, eles tomaram as armas e se juntaram ao exército lutando na linha de frente contra os muçulmanos, com sucesso. Para agradecer aos corajosos monges, Maximiliano I de Habsburgo concedeu-lhes o brasão imperial e um status muito elevado na sociedade da época, que durou até à Grande Guerra.
A história dos “pretzels salvadores da pátria” percorreu a Europa e aumentou substancialmente seu status de “comida da sorte”: na Suíça, os nobres costumavam dar como lembrancinha uns aos outros nas cerimônias de casamento; na Alemanha, as crianças faziam colares para usar na véspera de Ano Novo, para desejarem umas às outras boa sorte e prosperidade no próximo ano.
Eles também chegaram à América, no famoso “Mayflower”, o navio mercante que levou os “pais peregrinos” aos Estados Unidos em 1620; os pretzels secos (semelhantes aos que usamos como aperitivo) foram usados como moeda troca com os nativos americanos. A partir do século XVII, expandiram-se pelos Estados Unidos, sobretudo a partir de 1710, com a chegada em massa de imigrantes vindos da Alemanha, os quais trouxeram consigo, como todo emigrante, todas as tradições gastronômicas da sua terra.
Hoje, estão também no Brasil, e não só graças a uma famosa loja de fast food, mas também por causa das colônias alemãs no sul do País.
Uma receita aqui: https://www.tudogostoso.com.br/receita/30675-pretzel-delicioso.html.
Fontes de pesquisa:
“The Year of the Lord in the Christian Home”. Padre Francis X. Weiser S.J., Collegeville, Minnesota: The Liturgical Press. Very Good. 1964, 126 pp. (Um livro clássico dos tempos pré-Vaticano II que analisa o desenvolvimento e a história das festas e costumes cristãos, especialmente quando celebrados em casa) https://www.ebay.com/itm/126356500395;
https://www.instagram.com/p/C3bO_0hrE2C/?igsh=ZzN1bHV5M3Y1cDRq;
https://www.overland.org/la-lunga-storia-dei-pretzel/ (tem a receita em italiano);
https://www.cookist.it/bretzel-storia/.